08
de janeiro de 2015 | N° 18036
L.
F. VERISSIMO
A altura do
Levy
Paul
Krugman e Joseph Stiglitz não são donos da verdade, mas são donos de um prêmio
Nobel cada um. Os prêmios lhes dão uma respeitabilidade que eles não encontram
entre seus pares economistas, pois são os dois mais notórios inimigos da atual
ortodoxia – keynesianos nadando contra a corrente da maioria. Para Krugman e Stiglitz,
o receituário ortodoxo para vencer a crise mundial provocada pelo capital
financeiro equivale a receitar gasolina para apagar incêndios.
O
sacrifício de gastos sociais e as outra formas de austeridade vendidas com o
nome de fantasia de “responsabilidade fiscal” já provoca reações de
consequências imprevisíveis na Europa. Só quem está gostando da
irresponsabilidade social oficializada é o capital financeiro, que pariu a
crise e ama a sua cria.
Na
foto do espantoso novo ministério da Dilma que saiu nos jornais, destaca-se,
além do vestido da Kátia Abreu, o tamanho do ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Ninguém, nem o Rossetto, chega aos seus ombros. O que não deixa de ser
simbólico. Levy domina o grupo fotografado com sua altura como dominará o governo
com suas medidas de, sim, responsabilidade fiscal e austeridade. E a altura de
Levy tem outro significado: será difícil alguém chegar ao seu ouvido.
Alguém
preocupado com a incoerência de um governo do PT entregar-se tão
despudoradamente a uma ortodoxia de efeito duvidoso. Alguém pedindo clemência
para os programas sociais ameaçados, talvez a própria Dilma. Se não fosse
esperar demais, até alguém pedindo para ele ler Krugman e Stiglitz de vez em
quando. Mas o ouvido de Levy é inalcançável, à prova de palpites. Na própria
foto, ele parece estar com a cabeça numa camada superior da atmosfera,
respirando outro ar. Certamente não o mesmo ar do pastor Hilton, lá embaixo.
Imagino
que o Joaquim Levy tenha lido o Thomas Piketty, nem que seja só por curiosidade.
Piketty também nada contra a corrente. Se a questão maior para qualquer pessoa
que não seja um verme moral é a questão da desigualdade crescente no mundo,
Piketty prova que o capitalismo, do jeito que vai, só agravará o problema. Ele
chama a pretensão de que uma economia de mercado sem regulação acabará por
“elevar todos os barcos” e diminuir as desigualdades de “um conto de fadas”.
Mas esse conto de fadas é o outro nome da ortodoxia econômica que querem nos
impingir.
PAPO
VOVÔ
A
Lucinda, nossa neta de seis anos, me pediu para consertar a corda de um
cavaquinho que encontrara. Não consegui, e ela tirou o cavaquinho das minhas
mãos, dizendo “deixa que eu conserto, inteligência rara”. Inteligência rara!
Acho que vou baixar um decreto proibindo a ironia dentro de casa.