
07 de Julho de 2025
CLÁUDIA LAITANO
Imortalidade
No fundo, no fundo, ninguém acredita na própria morte. Pelo menos no inconsciente, garante Freud, cada um de nós está convencido de que é imortal.
Anos atrás, quando minha mãe descobriu a doença que iria matá-la pouco tempo depois, notei que ela parecia mais indignada, espantada até, do que propriamente assustada com o prognóstico. Era como se pela primeira vez, aos 75 anos, tivesse se dado conta de que, sim, poderia acontecer com ela o que acontece com todo mundo. Foi uma lição.
Ver minha mãe com tanta dificuldade para encarar a finitude me levou a querer agir de outra maneira quando chegasse a minha vez. Já vivi o suficiente para saber que não há racionalização que resista a determinadas contingências, mas, na medida em que estiver ao meu alcance, pretendo continuar concordando com Montaigne: "Qualquer que seja a duração da nossa vida, ela é completa".
Não por acaso, Eduardo Giannetti escolheu o ensaio - gênero inventado por Montaigne que consiste em uma conversa franca e inteligente com o leitor - para escrever seu memento mori para o século 21. O livro se chama Imortalidades (Companhia das Letras, R$ 90) e é composto por pequenos textos que refletem sobre a consciência da morte e seu contraponto: o desejo de continuar existindo.
Cada época tem uma maneira dominante de expressar seu anseio de perenidade, escreve Giannetti. Na Idade Média, o negócio era salvar a alma para a eternidade. No século 18, com o Iluminismo, alimentou-se a esperança de melhorar este mundo aqui mesmo, através da ciência. Para os românticos, mais tarde, a salvação era viver intensamente todas as paixões terrenas enquanto fosse possível. No século 21, surgem os bilionários dedicados a gastar até o penúltimo tostão para provar que morrer e ficar velho é coisa de pobre (a nova obsessão high tech é tema também do documentário O Homem que Quer Viver para Sempre, da Netflix).
Giannetti divide o livro em quatro partes. Na primeira, examina o sonho da extensão radical da vida biológica - da busca de Gilgamesh pela fonte da juventude ao transumanismo de Silicon Valley. A segunda parte é dedicada às esperanças de vida eterna oferecidas pelas religiões. As duas últimas contemplam os aspectos terrenos da posteridade: o que deixamos para o futuro, através dos genes e da memória que fica de nós, e como vivemos o presente, experimentando prazeres como o amor e o sexo, a fruição estética e o contato com a natureza.
Leia sem medo de ficar deprê. Imortalidades é um livro sobre morte que celebra a vida e as diferentes formas que cada um inventa para que o inevitável não seja necessariamente inominável.
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