09
de março de 2015 | N° 18096
L. F.
VERISSIMO
“Olha o velhinho!”
Um
fenômeno novo na realidade brasileira é o ódio político, o espírito golpista
dos ricos contra os pobres. O pacto nacional popular articulado pelo PT
desmoronou no governo Dilma e a burguesia voltou a se unificar. Economistas
liberais recomeçaram a pregar abertura comercial absoluta e a dizer que os
empresários brasileiros são incompetentes e superprotegidos, quando a verdade é
que têm uma desvantagem competitiva enorme.
O país
precisa de um novo pacto, reunindo empresários, trabalhadores e setores da baixa
classe média contra os rentistas, o setor financeiro e interesses estrangeiros.
Surgiu um fenômeno nunca visto antes no Brasil, um ódio coletivo da classe
alta, dos ricos, a um partido e a um presidente. Não é preocupação ou medo.
É ódio.
Decorre do fato de se ter, pela primeira vez, um governo de centro-esquerda que
se conservou de esquerda, que fez compromissos, mas não se entregou. Continuou
defendendo os pobres contra os ricos. O governo revelou uma preferência forte e
clara pelos trabalhadores e pelos pobres. Não deu à classe rica, aos rentistas.
Nos dois últimos anos da Dilma, a luta de classes voltou com força.
Não
por parte dos trabalhadores, mas por parte da burguesia insatisfeita. Dilma
chamou o Joaquim Levy por uma questão de sobrevivência. Ela tinha perdido o
apoio na sociedade, formada por quem tem o poder. A divisão que ocorreu nos
dois últimos anos foi violenta. Quando os liberais e os ricos perderam a eleição,
não aceitaram isso e, antidemocraticamente, continuaram de armas em punho. E,
de repente, voltávamos ao udenismo e ao golpismo.
Nada
do que está escrito no parágrafo aí em cima foi dito por um petista renitente
ou por um radical de esquerda. São trechos de uma entrevista dada à Folha de S.
Paulo pelo economista Luiz Carlos Bresser Pereira, que, a não ser que tenha
levado uma vida secreta todos esses anos, não é exatamente um carbonário. Para
quem não se lembra, Bresser Pereira foi ministro do Sarney e do Fernando
Henrique. A entrevista à Folha foi dada por ocasião do lançamento do seu novo
livro, A Construção Política do Brasil, e suas opiniões, mesmo partindo de um
tucano, não chegam a surpreender: ele foi sempre um desenvolvimentista
nacionalista neo-keynesiano.
Mas
confesso que até eu, que, como o Antônio Prata, sou meio intelectual, meio de
esquerda, me senti, lendo o que ele disse sobre a luta de classes mal abafada
que se trava no Brasil e o ódio ao PT que impele o golpismo, um pouco como se
visse meu avô dançando seminu no meio do salão – um misto de choque (“Olha o
velhinho!”) e de terna admiração. Às vezes, as melhores definições de onde nós
estamos e do que está nos acontecendo vêm de onde menos se espera.
Outro
trecho da entrevista: “Os brasileiros se revelam incapazes de formular uma visão
de desenvolvimento crítica do imperialismo, crítica do processo de entrega de
boa parte do nosso excedente a estrangeiros. Tudo vai para o consumo. É o paraíso
da não nação”.