terça-feira, 3 de novembro de 2020


03 DE NOVEMBRO DE 2020
DAVID COIMBRA

A pandemia para sempre 

Acho que essa pandemia não vai terminar nunca mais. Na Europa, pessoas que pegaram corona meses atrás já estão pegando outra vez. É a nova cepa, dizem. Nova cepa, nova cepa. Quantas cepas mais haverão de surgir? Covid modelo 21? Covid-22? Vinte e oito?

Esses vírus, eles são solertes. Eles vão se adaptando para encontrar mais hospedeiros. E é a isso que estamos reduzidos: somos hospedeiros de vírus. Que são hóspedes indesejáveis, mas nós não conseguimos mandá-los embora.

Lembro de quando eu era pequeno. Naquela época, havia uma instituição que hoje está extinta, a visita. Fazia-se visita. Não existia celular, internet, WhatsApp, mensagem de voz. A maioria das pessoas nem telefone tinha. Então, a visita acontecia de surpresa. Um casal reunia os filhos e tocava para a casa de outro casal. Você estava tranquilo, no recôndito do lar, e de repente alguém batia à porta. Você ia abrir e via uma família inteira em cima do capacho. "Ooooooi, viemos fazer uma visitinha...", anunciavam.

E entravam. E ficavam o dia todo lá. Conversando, comendo, bebendo.

Algumas amigas da minha mãe se negavam a ir embora por mais que eu e meus irmãos bocejássemos longamente, dando demonstrações visuais e sonoras do nosso cansaço. Ficavam conversando até de madrugada, aboletadas no sofá, falando, falando, que tanto assunto tinham?

Vírus! É isso que elas eram! Malditos vírus.

Mas tinha algo ainda pior. Era quando a minha mãe dizia: "Vamos fazer visita". Cristo! Era um dia perdido. Ainda recordo da sensação que experimentava de ver as horas passando molemente, e o aborrecimento tomando conta de meu ser, entorpecendo meus nervos, tornando-se um paralelepípedo no meu peito. Cara, como era chato fazer visita! Nós não íamos embora jamais, e eu nem podia dizer que queria ir para casa, minha mãe ia mandar de volta um olhar de fúria e fogo ou pronunciar a mais terrível frase da minha infância: "Depois nós vamos conversar sobre isso".

Eu me sentia um vírus.

Pois é assim que é. O corona veio fazer uma visita ao planeta Terra e ficou. Teremos de conviver com ele até a madrugada da nossa existência. Nunca mais sairemos à rua sem usar máscara. Nossas mãos ficarão eternamente melecadas de álcool gel. Festas? Carnaval? Estádio cheio? Tudo isso acabou. E, se você tiver mais de 60 anos, prepare-se para permanecer o resto da vida em casa.

A não ser, é claro, que todos tomem a vacina. Você não vai acreditar, mas muita gente que conheço não quer tomar a vacina. Muita gente que conheço é CONTRA vacinas! O que está acontecendo com o mundo? Antes, as pessoas se vacinavam sem contestação, era até bonito mostrar a marquinha da BCG no braço. Agora, na era da informação instantânea, há quem faça campanha contra vacinas, e algumas doenças que já estavam extintas voltaram.

Veja que coisa horrível aprendemos sobre o ser humano, leitor: devido à velocidade e à eficiência das comunicações, o obscurantismo atinge mais pessoas do que a ciência. Entre a informação e a fraude, elas preferem a fraude. Assim, quanto mais as pessoas estão conectadas, mais a ignorância se espalha e se entranha. Como um vírus. As facilidades da telefonia e da internet melhoraram o mundo, de fato. Mas, hoje, como as visitas de antigamente, as trevas e a escuridão batem à porta sem avisar.

DAVID COIMBRA

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