quinta-feira, 5 de maio de 2022


05 DE MAIO DE 2022
RODRIGO LOPES

A paz é exceção

A algumas semanas de comemorar meus 44 anos, confesso: estou mais pessimista. Com quatro guerras nas costas, me tornei uma pessoa de pouca fé. Logo eu, forjado em grupo de jovens da Igreja Católica. Infelizmente, não acredito tão facilmente na paz. Ou, melhor dizendo, a vejo como um hiato na história da humanidade.

A guerra não é uma patologia. É seu estado normal. Isso não exclui o sofrimento. Como diz o historiador Niall Ferguson, quando a vida era "solitária, sórdida, brutal e breve", como foi durante 99% do tempo em que nossa espécie existiu, as necessidades mais prementes eram caçar ou reunir alimentos em quantidade suficiente e se reproduzir. Os homens formavam pequenos grupos, porque a cooperação aumentava as chances de cada indivíduo conseguir fazer ambas as coisas. Mas tribos entravam em contato umas com as outras e, inevitavelmente, acabavam competindo por recursos escassos. Daí, o conflito podia assumir a forma da pilhagem - a captura, mediante violência, dos meios de subsistência da outra tribo - e o assassinato puro e simples de pessoas para se livrar dos rivais.

O homem, assim como alguns neodarwinistas argumentam, é programado por seus genes para proteger os seus próximos e combater o outro. A Bíblia é uma sucessão de atos de extrema violência, com todo tipo de agressão, a começar por Caim e Abel.

É possível separar a moral política da moral comum. Thomas Hobbes disse que, como o homem é o lobo do próprio homem, só o Estado seria capaz de conter nossos impulsos mais macabros. E a Primeira Guerra Mundial era para ser a "guerra para acabar com todas as guerras". Woodrow Wilson cunhou as 14 teses para um mundo idealista em que a colaboração seria mais vantajosa do que o conflito, mas veio a Segunda Guerra Mundial e vimos que não era, assim, tão fácil. Convenhamos, a Guerra Fria não foi também tão fria: houve Coreia, Vietnã, as ditaduras do Cone Sul. E o colapso soviético e a vitória do liberalismo trouxeram a ideia de que um mundo cada vez mais conectado, de Estados que negociavam uns com os outros, não faria a guerra. A tal pax kantiana falhou.

Não importa quão complexa possa ser a estrutura administrativa, o Leviatã, não podemos perder de vista os instintos básicos ocultos dentro até mesmo do mais civilizado ser humano. A história sempre foi um banho de sangue: dos cativos da Babilônia aos caídos do Holocausto ou do Donbass. O fim da Guerra Fria foi apenas um sopro de esperança para ingênuos. Havia Dresden, Hiroshima e Nagasaki, vieram Srebrenica e Mariupol. Na guerra, o ser humano se revela por inteiro: eu acreditava que o pior e o melhor vinham à tona em situações como essa. Infelizmente, vejo só o pior. Espero que, pelos próximos 44 anos, eu possa mudar de ideia.

*O colunista David Coimbra está em licença médica - INTERINO

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