terça-feira, 10 de março de 2015


10 de março de 2015 | N° 18097
LUÍS AUGUSTO FISCHER

A POESIA DE PAULO HECKER

O IEL, ainda na gestão anterior, lançou um livro precioso (outro livro precioso, de fato): a Poesia Reunida, de Paulo Hecker Filho (1926 – 2005), sob organização e prefácio de Celso Gutfreind e Alexandre Brito. De minha parte, esperava pela edição há tempos, e posso dizer que mesmo em vida do poeta eu costumava imaginar uma antologia do melhor de sua poesia, que não é pouca mas é, era, muito dispersa.

Na verdade, toda a produção de Paulo Hecker conheceu a vida de modo muito irregular. Tendo publicado desde seus 20 anos, ele foi um caso raro em literatura – um talento evidente, que se apresentou nos mais variados gêneros (poesia, teatro, conto, romance, memória, crítica, ensaio), mas sem continuidade no tempo e sem, no fim das contas, haver fixado uma imagem, um estilo, uma marca.

Aliás, num texto da maturidade, Paulo Hecker falou sobre isso abertamente: queixou-se de não haver encontrado seu público e de, por isso, ter dispersado sua energia criativa em muita coisa. Deve ser duro constatar algo assim.

O presente livro mostra que há razões sobrantes para incluir o poeta no repertório dos melhores que o Estado tem visto nascer, desde sempre. Um traço confessional, que sai da ficção em busca da vida (a real do poeta, a virtual do leitor), marca o melhor que escreveu. Hecker teve experiência de vida suficiente para ver de perto o lado escuro das coisas, e fez disso poesia, triste, dura, impiedosa, exemplar.


E tem um lado reflexivo que me parece da melhor qualidade. O poema Transitório continua a me alegrar, sutilmente: “E pensar que o autor deste verso não existe mais. / Pensar nos trabalhos de seus dias, / que às vezes amou, outras se viu ferido, / quis viver e quis morrer, como qualquer um, / e mesmo assim teve alento para deixar que viesse até ele este verso, / que o salvou na hora e nos salva agora”. Agora, exatamente agora, de novo.