terça-feira, 10 de maio de 2022


10 DE MAIO DE 2022
NÍLSON SOUZA

O coração do imperador

Noticia a Agência Lusa que o governo brasileiro pediu à Câmara Municipal do Porto para trazer ao Brasil o coração de Dom Pedro I, que repousa há 185 anos na Igreja da Lapa, naquela cidade portuguesa. A ideia é expor o órgão ao público durante a celebração dos 200 anos da Independência, em setembro próximo. Com todo o respeito aos apreciadores de relíquias mórbidas, bem que a gente podia gastar melhor o dinheiro dessa planejada remoção temporária.

Com bons livros, por exemplo - para que nossos jovens conheçam melhor a história do país e a biografia de seus governantes, até como subsídio para suas futuras escolhas. À luz do conhecimento, o coração de Dom Pedro I vale bem menos do que o cérebro de seu filho Dom Pedro II, que chega a ser considerado por alguns historiadores o maior brasileiro de todos os tempos. O barbudo nasceu no Rio de Janeiro, governou o país por mais de 50 anos e se notabilizou tanto pela cultura quanto pela austeridade e pela seriedade na administração dos gastos públicos:

- Despesa inútil é furto à Nação - dizia.

Educado para governar o reino herdado, o príncipe virou imperador e tornou-se um homem culto, poliglota, defensor da arte e da ciência. Vivia cercado de livros. Foi reconhecido mundialmente e respeitado por cientistas, filósofos, músicos e outros intelectuais de sua época. Ainda assim, mostrava-se humilde e valorizava o saber:

- Se eu não fosse imperador, gostaria de ser professor - costumava dizer.

Alcançou grande popularidade depois da vitória brasileira na Guerra do Paraguai, tanto que a Assembleia Geral do país cogitou homenageá-lo com uma estátua equestre pela bravura de ter cavalgado até Uruguaiana, então cercada pelas forças paraguaias. Contam os biógrafos que o imperador rejeitou a homenagem e sugeriu que o dinheiro fosse gasto na construção de escolas de ensino primário.

Já seu pai - pelo que conta Laurentino Gomes no seu 1822, que estou relendo agora - era semianalfabeto, da mesma forma que a Marquesa de Santos - esta, sim, com compreensíveis razões para se interessar pelo polêmico coração imperial. Com a sua amante, Dom Pedro I gastou tudo e mais um pouco do que o filho pouparia mais tarde, ao vetar despesas públicas inúteis.

Aí veio a República e liberou geral. Mas isso já é outra história.

NÍLSON SOUZA

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