
24 DE MAIO DE 2021
DAVID COIMBRA
Houve luxos neste Gre-Nal feio
Depois de 15 dias de recolhimento, ter um Gre-Nal de decisão de
campeonato para voltar a escrever é um luxo. O dia foi feio e cinza, é verdade.
O jogo foi mais brigado do que jogado, também é verdade. Mas, ainda assim,
trata-se de um luxo. Até porque há coisas especiais nessa decisão. Há
alvíssaras, sobretudo no lado vencedor, o Grêmio.
Uma não chega a ser uma alvíssara, e sim uma renovada
constatação: Pedro Geromel. Depois da semifinal, o técnico do Caxias foi
perguntado a respeito da razão de o seu time não ter conseguido mais jogadas de
perigo. Ele respondeu:
- O zagueiro do Grêmio é o Pedro Geromel.
Não precisou dizer mais nada, estava explicado. Geromel virou
adjetivo. Geromel é um fenômeno de antecipação, de colocação, de visão do lance
defensivo. O Rio Grande do Sul teve monstros na zaga central: Nena, do Rolo
Compressor, Aírton, 12 vezes campeão, Figueroa, bruto e poeta ao mesmo tempo,
De León, o capitão campeão do mundo, além de Oberdan, Índio, Adilson, Mauro
Galvão e Lúcio, entre tantos. Geromel suplanta a todos, e afirmo essa
temeridade sem nem ter visto Nena e Aírton jogarem.
Neste domingo, Geromel passou a tarde afastando a bola da área
do Grêmio. Alguém mais distraído diria que a bola sempre ia aonde ele estava.
Ao contrário: ele SABIA onde a bola cairia. Geromel olha para o atacante e
antevê o que ele vai fazer. Com Geromel e Kannemann na área, o sempre atento
Thiago Santos à frente deles e o seguro Brenno atrás, o Grêmio fica perto do
impermeável.
Mas o protagonista do jogo não foi nenhum desses: foi o
ponta-esquerda Ferreirinha. Gosto de escrever isso: ponta-esquerda. Há uma
história antiga a respeito de pontas, já contei, conto de novo, é boa. Numa
cidade do interior profundo do Brasil, o Exército estava procedendo ao
alistamento de novos recrutas. Havia uma fila de jovens diante da mesa do
sargento, que ia tomando nota dos dados. Ele perguntava para cada candidato:
- Nome? - Idade? - Profissão?
Assim por diante. Até que chegou um mais retaco, mais fortinho,
fez posição de sentido, deu o nome, deu a idade e, ao chegar na profissão,
detalhou:
- Eu marco ponta!
Era como funcionava, antes. Havia o ponta e havia o marcador de
ponta. Até que o ponta foi banido, os times queriam se fechar, eram quatro no
meio-campo, cinco, até seis.
Bem, agora eles estão de volta, e Ferreirinha é um lídimo
representante dessa estirpe. Ele fez o gol do título, dando um corte seco, de
ponta, no marcador do Inter. Ele prendeu a bola na esquerda durante quase todo
o tempo de prorrogação. Ele foi o jogador mais perigoso da partida.
O Grêmio tem ponta-esquerda. O que é bonito. E terá
ponta-direita, Douglas Costa, que está chegando. Com um pormenor, que valoriza
ainda mais as loas que teci ao zagueiro aí de cima: foi Geromel que acertou sua
contratação. Um zagueiro craque que contrata atacante craque. Não. Nunca houve
ninguém como Geromel.
DAVID COIMBRA
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