sábado, 27 de outubro de 2018


27 DE OUTUBRO DE 2018
DRAUZIO VARELLA

SAÚDE E DINHEIRO


apesar do alto investimento financeiro, expectativa de vida nos estados unidos só cai

Dinheiro não traz felicidade, diz o povo. Embora haja controvérsias, a julgar pelo exemplo dos Estados Unidos, nem saúde: pelo segundo ano consecutivo, a expectativa de vida dos americanos diminuiu.

Em 1960, eles tinham a expectativa de vida mais alta do mundo. Chegava a 2,4 anos a mais do que a média dos países da OECD (Organization for Economic Cooperation and Development - uma cesta de 35 países, entre os quais os mais ricos e desenvolvidos). Em 1998, a expectativa de vida no país ficou para trás da média da OECD. Hoje, a diferença já é de 1,6 ano: 78,7 anos contra 80,3 anos na OECD.

Um painel conjunto do National Research Council e do Institute of Medicine investigou as causas dessa desvantagem crescente. A conclusão foi a de que a saúde dos americanos é mais pobre em diversos aspectos: obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares, ferimentos, homicídios, complicações de parto, gravidez na adolescência, consumo de drogas ilícitas e infecções pelo HIV.

Ficou evidente, também, que o estilo de vida é menos saudável do que o dos países da OECD: as cidades privilegiam o automóvel, a população costuma ingerir alimentos altamente calóricos, abusar de álcool e possuir armas de fogo. Aqueles com renda familiar mais baixa têm menos suporte social, previdenciário e acesso limitado à assistência médica.

As mortes por overdose aumentam a cada ano. Em 2015, foram 64 mil; neste ano, serão 70 mil, números que ultrapassam o total das mortes de soldados americanos na guerra do Vietnã.

Numa análise publicada no Bristish Medical Journal, por Steven Wolf e Laudan Aron, os autores consideraram esses óbitos a "ponta do iceberg" de uma crise de saúde mais abrangente: a mortalidade associada ao abuso de álcool e aos suicídios, que afeta especialmente os brancos de meia idade e certas comunidades rurais.

As causas estariam ligadas ao colapso das indústrias locais, à erosão dos laços comunitários, ao isolamento social, à pressão financeira e à consciência dos trabalhadores de que perderam o padrão de vida que os pais um dia tiveram.

Entre os negros, o número de suicídios e de mortes por overdose não aumentou. Os autores atribuem esse fenômeno à maior resiliência de mulheres e homens negros, habituados a enfrentar desvantagens econômicas, discriminação, preconceito social e mortalidade geral mais elevada.

De outro lado, nos últimos anos, as diferenças sociais se acentuaram, a performance escolar piorou, os salários da classe média estagnaram e os níveis de pobreza aumentaram em relação aos dos países desenvolvidos. O país é rico, mas desigual: os mais pobres têm dificuldade de acesso a serviços sociais, à assistência médica, à prevenção e ao tratamento de transtornos psiquiátricos e dependência química.

Os Estados Unidos investem em saúde 17% de um PIB de US$ 19 trilhões, ou seja, cerca de US$ 3,2 trilhões. É mais do que o PIB inteiro do Brasil. Para justificar esse gasto, o americano médio deveria viver 110 anos, pelo menos. Quem nasce em Santa Catarina vive mais.

DRAUZIO VARELLA

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