03 DE AGOSTO DE 2022
OPINIÃO DA RBS
FORMAR COM QUALIDADE
A proliferação acelerada de cursos de educação a distância (EaD) no Ensino Superior merece mais atenção. Não se trata de depreciar o sistema em si, que em muitos países é bem empregado, de forma complementar, voltado à inclusão. Mesmo no Brasil, inclusive no Rio Grande do Sul, há instituições reconhecidas que também oferecem o modelo, zelando pela qualidade. Mas os números apresentados em reportagem de Marcel Hartmann publicada ontem em Zero Hora são eloquentes ao ilustrar uma propagação, ao que parece, bem além do razoável. É um fato que exige um acompanhamento e uma fiscalização mais rígidos quanto à formação proporcionada e mesmo em relação a novas autorizações para oferecer a modalidade.
Em um intervalo de 10 anos, a oferta de cursos a distância cresceu 486%, enquanto a de presenciais subiu somente 22%. Dos 8,7 milhões de universitários existentes no país, 3,1 milhões já estudam de maneira remota. Recente nota técnica do Todos pela Educação apontou que, de 2010 a 2020, a quantidade de concluintes em faculdades privadas voltadas à formação de professores saltou 110% na modalidade EaD, enquanto na presencial diminuiu. Hoje, seis em cada 10 docentes que chegam ao mercado de trabalho foram preparados de maneira virtual.
A educação a distância teve um importante papel durante o período mais crítico da pandemia e é uma opção válida para alunos que, seja qual for a razão, têm dificuldade para frequentar aulas presenciais. Mas o que ocorre no Brasil é um nítido crescimento desordenado, com uma supervisão no mínimo falha do Ministério da Educação (MEC). Embora não se deva generalizar, as próprias avaliações periódicas da pasta indicam desempenho inferior das faculdades com aulas remotas.
É salutar que mais pessoas busquem formação superior, movidas por melhores perspectivas no futuro. Devido à crise econômica, os cursos de EaD tornaram-se mais atrativos. Como têm custos muito menores, as mensalidades são bem mais em conta. Mas cabe ao MEC garantir que o país não tenha apenas mais cidadãos graduados, como se fosse uma produção em série.
Os novos profissionais têm de ter a qualificação necessária para também contribuir de maneira positiva para a sociedade nas funções que forem exercer. Um dos problemas econômicos do país tem sido a estagnação da produtividade do trabalho e, da forma atual, se está apenas perpetuando este problema. Mais salutar seria se o governo federal voltasse a mostrar mais interesse em mecanismos como o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), direcionando uma quantidade maior de jovens a universidades reconhecidas, onde também terão oportunidades de usar laboratórios, fazer a iniciação científica e participar de atividades de extensão.
Muitas graduações, é verdade, têm maior carga teórica. Mas não há substituição à altura para a troca de ideias na sala de aula e para a possibilidade de tirar dúvidas com professores nas classes para melhor absorver conteúdos. Sem falar em cursos como os da área de saúde e os que têm de compreender a complexidade de estruturas materiais, onde a experiência prática é basilar.
Mesmo na graduação de docentes, o que deveria ser uma exceção está virando uma regra, tornando duvidosa a capacidade de, depois, bem ensinar milhões de crianças e adolescentes. A educação não pode ser somente uma mercadoria vendida por quem presta um serviço, formando em escala industrial. É preciso zelar pela qualidade para também ser assegurado o retorno social proporcionado por bons professores, enfermeiros, engenheiros e administradores, entre outros profissionais.
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