Buda rindo
Olho os prédios, a garoa e a calmaria do feriado do Dia do Trabalho e fico pensando no que escrever para os meus doces, fiéis e vorazes leitores. Penso em escrever uma brevíssima história do futuro do Brasil, depois da eleição de alguém de esquerda, direita, centro, centro-esquerda, centro-direita, liberal de direita, liberal de esquerda, quarta ou quinta via. Rótulos e definições estão bem embolados e indefiníveis, estou meio perdido a respeito, assim como as torcidas do Flamengo e do Inter. Tomara que venha algum Tancredo, algum mediador da Pátria para juntar nossos cacos e seguirmos adiante, com nosso parto federal interminável.
Estamos mais confiantes no fim, ou ao menos, na diminuição da corrupção. É muito. Pensei em falar de ética, de mundo em mudança, de desigualdades e rumos para o futuro. Pensei em falar em futebol, mas sou colorado e aí deixo esse assunto para mais adiante. Pensei em escrever sobre a falta de assunto ou nos cronistas que podem ficar desempregados por Lula e outros estarem guardados. Ao lado da tela do computador a estátua do Buda Rindo, ou Buda que ri, me sorri e diz: dá um tempo, não esquenta tanto.
Quieci ou Budai, provavelmente monge budista, nasceu há mais de mil anos. Esfrego sua barriga gorducha para deixá-lo ainda mais sorridente e feliz e para que ele leve, no seu saco de pano, minhas preocupações. Como disse o querido Agildo Ribeiro, que deve estar imitando muito bem o São Pedro lá em cima, a preocupação é um pássaro que pousa na nossa cabeça e não devemos deixar ele fazer um ninho. Espanta o pássaro, aí, Buda que ri!
Alguns Buda que ri têm contas no pescoço, que são as pérolas da sabedoria, crianças em volta, um leque para ativar boas energias ou um chapéu para celebrar vida longa e feliz. O Buda que ri é do tipo que não ganha Oscar, não provoca grandes filosofanças e não está em primeiro na lista dos mais vendidos. De repente ele é nono ou décimo no top ten dos Budas. Quando ele morreu e morreu seu sorriso físico, as pessoas choraram, mas ele antes disse para que todos seguissem adiante, que a vida continuava.
Na China muitos chamam o Buda risonho de The loving one ou The friendly one. Quando ele chegava nos lugares, sempre rindo, todos começavam a rir também, mesmo sem ter a menor ideia do motivo. Há muitos estátuas diferentes do Buda Sorriso, que devem ser acariciadas, mantidas limpas e jamais colocadas no chão. Na sala, perto da porta ou no local de trabalho, o Buda sente-se feliz e irradia coisas boas.
O Buda está bem consciente dos problemas econômicos, políticos e éticos do planeta e torce por liberdade, igualdade, fraternidade, natureza e sonha com pessoas, ideias e ações saudáveis e agregadoras. Mas sua missão maior é passar risos, sorrisos e energias para as pessoas e para o mundo.
Seu sorriso atravessa o milênio e nos ensina a não nos levarmos tão a sério, que aí nós e a vida ficamos chatos. Sabe muito, o Buda Rindo.
a propósito...
Os outros 20 e tantos Budas são igualmente importantes.
Talvez até mais importantes que o Buda que Ri. Os Budas sérios, meditativos, preocupados, brabos e graves são candidatos a Prêmio Nobel, um galardão quase sempre sério. Cada um com seus poemas. Cada um com sua missão. No final do jogo de xadrez, rei, rainha, bispos, cavalos, torres e peões vão para a mesma caixa.
Se forem sorrindo, melhor para eles. Esquerda, direita, centro, tempo, espaço, vida e morte e vaidades vão e vêm nestes mundos e caminhos intermináveis. Let it be, Hey Jude, cantarola o Buda que ri, lamentando o pedido de falência da fábrica de guitarras Gibson, sorrindo para a eternidade e espalhando energias do bem para todos, mesmo para quem até não merece. -
Jornal do Comércio (http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2018/05/colunas/livros/624900-vida-alem-da-ficcao.html