sábado, 16 de janeiro de 2021


16 DE JANEIRO DE 2021
CARTA DA EDITORA

Olhar atento

Em outra ocasião, comentei neste espaço que o repórter, depois de publicar uma matéria investigativa, vira "dono" do assunto. É obrigação acompanhar o desenrolar dos fatos denunciados por ele próprio.

Em 2015, Humberto Trezzi havia feito uma reportagem intitulada "Minha casa minha fraude", em que mostrava como residências do programa habitacional Minha Casa Minha Vida construídas em Canoas, Esteio, Cruz Alta, Pelotas e Porto Alegre estavam sendo usadas de forma irregular. Eram vendidas, alugadas e até invadidas, virando moradias de pessoas que nada tinham a ver com o contrato original. Práticas proibidas, já que o programa se destina a pessoas carentes, que recebem o imóvel de forma que tenham condições de pagar por ele um valor simbólico.

Por duas vezes, em 2018 e no ano passado, Trezzi retornou ao tema para mostrar que essas práticas continuavam. Flagrou novamente moradores do Minha Casa ofertando imóveis para venda ou aluguel, sem que houvesse alguma fiscalização por parte das autoridades.

Na edição deste fim de semana, Trezzi, em parceria com Eduardo Matos, ambos integrantes do Grupo de Investigação da RBS (GDI), voltaram ao assunto, como mostra a reportagem das páginas 12 e 13, desta vez para revelar um número preocupante: 2.891 processos relativos a problemas construtivos ou de abandono de prédios populares no Rio Grande do Sul tramitam na Justiça Federal. Ou seja, além de venda e locação ilegais, há um outro problema envolvendo esses condomínios, que são as construções malfeitas ou abandonadas no meio do caminho.

De 2015 para cá, Trezzi já nota que há um olhar mais atento da Justiça para a área de habitações populares:

- Foram unificados procedimentos para evitar retrabalho nos julgamentos. Quando periciado um apartamento num prédio com problemas, por exemplo, vale de amostra para todos os inquilinos do edifício. Há estímulo a ações coletivas, também. Evitar que um só proprietário mova a engrenagem da Justiça - conta o repórter.

Colocar luzes sobre temas muitas vezes relegados ao esquecimento é papel do jornalismo. E ficar acompanhando os desdobramentos também. 

DIONE KUHN

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