17 de fevereiro de 2014
| N° 17707
ARTIGOS - PAULO
BROSSARD*
O macabro baile dos mascarados
Tudo começou com manifestações
que se distinguiram pela circunstância de apresentarem-se com máscara os
manifestantes, o que impedia a identificação desses. Os mascarados
permitiram-se a prática de atos ilícitos com danos materiais e morais, consistentes
na depredação de prédios públicos, vitrines de estabelecimentos comerciais e
bancários. Esta conduta se repetiu algumas vezes, e nenhuma vez nenhuma
autoridade tomou nenhuma providência. Tinha-se a impressão de que a autoridade
ou entendia que em uma manifestação em termos civilizados se continha a
prerrogativa de destruir bens privados ou públicos, ou tinha medo de cumprir a
lei, se é que lei alguma permite que alguém, a seu arbítrio, possa lesar
gratuitamente o próximo.
A omissão oficial obviamente
passou a servir de estímulo para os abusos aumentarem. Não era costume, até
então, destruir ônibus, mediante o incêndio deles, mas o expediente macabro era
curioso, uma vez que inédito, e a destruição desses bens se tornou mais ou
menos habitual, porque também ela constituía uma novidade. Só na cidade de São
Paulo mais de 30 ônibus foram consumidos pelo fogo, em questão de dias. Depois,
era fácil iniciar a operação, bastando quebrar um vidro e jogar um coquetel
molotov, para que o objeto ficasse reduzido a um esqueleto de máquina. A partir
daí o quebra-quebra estava institucionalizado, seja pela passividade da
custódia inerente ao poder público, revogada por omissão culposa, seja por
ordem superior, como ocorreu aqui entre nós.
Pode-se dizer que a lassidão, a
indiferença e a covardia passaram a ocupar o lugar reservado à fidelidade à
lei, ao dever funcional e ao senso de responsabilidade. Era natural que os
desvios do poder permitidos às escâncaras não parassem aí, era evidente que
eles seriam agravados, só um tolo podia imaginar que a desordem ficasse
satisfeita com os males causados. O que era inevitável ocorrer aconteceu.
Com efeito, em manifestação
pacificamente iniciada na altura da Central do Brasil, no Rio, os mesmos
mascarados começaram a fazer o que deles é habitual, duas pessoas conduziam
sucessivamente um foguete e, a certa altura, foi ele aceso e jogado ao chão e
em pleno movimento veio a atingir um profissional, cinegrafista da
Bandeirantes, Santiago Ilídio Andrade; atingido na cabeça, foi levado ao
Hospital Souza Aguiar e submetido a demorada intervenção; chegou em estado
grave e assim continuou até a morte.
A reação social foi imensa e
houve quem imaginasse que o fato poderia servir para afastar os excessos
rotineiros, mas dois fatos ocorreram de imediato, que me deixaram cético; o
primeiro deles ocorrido no Rio de Janeiro, na Avenida Presidente Vargas, na altura
da Central do Brasil; como de estilo, os encapuzados iniciaram depredação da
qual não ficaram imunes prédios e não faltaram feridos no quebra-quebra; o
outro, manifestação realizada em Brasília, maior e mais expressiva, estimada em
15 mil pessoas, vestidas uniformemente, obviamente originários de vários
Estados e que, depois de comprometer o trânsito local, tentaram ingressar no
Planalto; diante da resistência, reagiram, resultando feridos, sendo dois em
estado grave. Essa movimentação não se faz sem recursos abundantes. Fato que
está a mostrar que há mais coisas no ar do que os aviões de carreira.
Este quadro esboçado, breve e
superficialmente, está a indicar a natureza e gravidade das organizações que a
esta altura dão fisionomia a um conflito que, talvez, a senhora presidente, no
seu afã eleitoral, não tenha medido.
Antes que esqueça, assoalha-se
até pela imprensa que os mascarados receberiam R$ 150 diários para melar as
manifestações. Verdade? Fabulação?
*JURISTA, MINISTRO
APOSENTADO DO STF