terça-feira, 19 de outubro de 2021


19 DE OUTUBRO DE 2021
OPINIÃO DA RBS

RECICLAGEM DE POSTURA

Podem existir razões que expliquem, mas não há justificativa aceitável para o retrocesso na coleta seletiva na Capital nos últimos anos. Reportagem de Marcelo Gonzatto publicada no caderno DOC aponta que, desde 2015, o percentual de resíduos recicláveis recolhidos e repassados para reaproveitamento caiu cerca de um terço em Porto Alegre. Ou seja, há menor cuidado no momento de acondicionar o lixo e maior mistura com os restos orgânicos. 

Espanta ainda que, mesmo com esta involução, a cidade apareça na sétima posição entre os municípios brasileiros com mais de 250 mil habitantes com os melhores indicadores na área, conforme a edição de 2020 do Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana. Um sinal inconteste do quanto o país vai mal nesse quesito, que não deixa de ser uma régua capaz de medir o grau de maturidade e de educação de uma sociedade. Caxias do Sul (10º) e Pelotas (20º) aparecem relativamente bem ranqueados, mas também estão apenas em uma situação não tão lastimável quanto a média nacional.

Sabe-se que separação correta do lixo tem dois grandes benefícios. Em primeiro lugar, faz com que idealmente apenas as sobras orgânicas e rejeitos imprestáveis sejam enviadas para os aterros sanitários e lixões, reduzindo o volume de detritos remetidos para esses locais, gerando menor impacto ambiental. Em segundo, porque todos os itens recicláveis, como vidros, plásticos, papéis e metais poderiam ser direcionados para os pontos de triagem, onde são selecionados por trabalhadores em situação de vulnerabilidade - que tiram o seu sustento da atividade - e reencaminhados para o reaproveitamento, diminuindo a pressão sobre os recursos naturais. Só há vantagens no processo e, por outro lado, prejuízos financeiros e ao ambiente se somam quando a prática não é adotada.

A solução, sem dúvida, passa por uma conscientização maior da população. É um esforço que deve começar por uma atenção adequada ao tema da educação ambiental nas escolas e contemplar um reforço nas campanhas do poder público para motivar os cidadãos para que comecem a separar o seu lixo doméstico ou voltem a adotar a prática. Junto a isso, é indispensável que essa organização tenha continuidade nas etapas seguintes, como por parte dos condomínios, e das prefeituras, que devem oferecer um serviço de coleta que mantenha a segregação e a destinação correta de cada tipo de resíduo. Mas o ponto de partida é a mudança de comportamento da população. 

A recente decisão da administração de Porto Alegre de recolher do Centro Histórico 50 contêineres para a coleta mecanizada de recicláveis devido à mistura que estava ocorrendo com rejeitos orgânicos é um indício da falta de comprometimento. Mas é possível que, com uma orientação mais clara, os resultados possam ser mais satisfatórios.

As estatísticas oficiais apontam que, em 2008, chegou a 7,1% o percentual do lixo direcionado para reciclagem na Capital. Muito pouco diante do exemplo de países europeus, onde o índice chega a ser superior a 50%. E, desde então, os números de Porto Alegre vêm piorando, chegando a apenas 4,5%. Estima-se que, das 1,12 mil toneladas de resí- duos recolhidos diariamente na cidade, cerca de 250 toneladas a mais poderiam ser recicladas. 

Um enorme desperdício, tudo indica repetido na maior parte das cidades gaúchas. Há ainda o problema de cunho social dos catadores não cadastrados que competem pelos resíduos, o que mostra a complexidade de uma solução. As dificuldades, no entanto, não devem ser razão para manter os braços cruzados ou permanecer com atitudes pessoais que apenas agravam o quadro. As saídas possíveis têm de obrigatoriamente conjugar uma reciclagem na postura dos cidadãos e serviços adequados por parte do poder público.

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