quinta-feira, 15 de dezembro de 2016



15 de dezembro de 
2016 | N° 18715 EDITORIAIS

REFORMAS IMPOPULARES

É de um simplismo abissal a ideia de que o governo federal e os governos dos Estados endividados estão propondo aos Legislativos contenção de gastos e ajustes fiscais porque são maus, não gostam de servidores públicos ou porque estão a serviço da elite econômica. Qual o governante que não preferiria terminar o seu mandato distribuindo benesses e saindo aplaudido pela sua generosidade? Só que essa mágica com o chapéu alheio acabou. O Estado brasileiro está falido, as unidades federativas também, pela mesma razão: vêm gastando mais do que arrecadam. Isso, sim, é um raciocínio simples de entender.

Para acabar com essa irresponsabilidade histórica, agora é preciso impor sacrifícios a todos. Não há mais espaço no setor público, seja em qual for o poder ou a instância da federação, para gestores lenientes com a seriedade fiscal. O mesmo alerta é válido para servidores habituados a encarar o setor público como algo imutável e imune a mudanças externas que imponham revisões constantes nas prioridades sob o ponto de vista dos contribuintes. 

Obviamente, essas readequações têm um custo, que incide com maior intensidade sobre parcelas como a dos servidores e aposentados, no caso da definição de um teto para os gastos públicos e na inadiável aprovação da reforma da Previdência. Diante da gravidade da crise, porém, com um recuo acelerado nas receitas em âmbito federal e nos Estados, só é possível garantir minimamente os interesses do conjunto da população enfrentando os gastos.

Compreende-se que os setores mais atingidos protestem, que façam greves, que reivindiquem seus direitos – desde que dentro da lei e da ordem. Atos de vandalismo não podem ser tolerados. Nem se pode aceitar argumentos simplórios e hipócritas para entravar as reformas, principalmente quando partem de corporações que tentam manter seus privilégios acima de tudo.

AGENDA DE CONFLITOS

O pedido de demissão de José Yunes, assessor especial do presidente Michel Temer, formulado ontem em caráter irrevogável, acrescenta mais combustível ao conflito entre os investigadores da Lava-Jato e a cúpula do PMDB, que comanda o governo e o Senado. O advogado, amigo de Temer há 50 anos, sai do governo no dia seguinte à divulgação da delação premiada do ex-diretor da Odebrecht que o identificou como receptor de doação feita ao partido pelo departamento de propinas da empreiteira. 

Na véspera, o próprio presidente da República, contrariado com o vazamento dos depoimentos, encaminhara carta ao procurador-geral Rodrigo Janot solicitando celeridade nas investigações para evitar interferência na agenda política do país.

A reação dos parlamentares foi menos sutil e mais agressiva. Ameaçados pelas delações da Odebrecht e pela divulgação gradativa de depoimentos, parlamentares liderados pelo senador Renan Calheiros, com o apoio velado da cúpula do governo, estão em campanha aberta contra o Ministério Público Federal. Enquanto o governo reclama que os chamados vazamentos seletivos estão entravando a governabilidade e o andamento das reformas necessárias para tirar o país da crise, o presidente do Senado ressuscita o projeto da lei de abuso de autoridade, que prevê punições rigorosas para juízes e procuradores, encarado como tentativa de intimidação aos integrantes da força-tarefa da Lava-Jato.

O apoio inequívoco e majoritário da população brasileira não deixa dúvida de que a Operação Lava-Jato está prestando um serviço valioso ao país no combate à corrupção. Talvez esteja mesmo retardando reformas necessárias para o enfrentamento da crise econômica e do desemprego. Mas nada pode ser mais urgente do que continuar a limpeza ética na política e na administração pública do país, para devolver aos brasileiros a confiança na democracia e no futuro.