quinta-feira, 22 de dezembro de 2016



22 de dezembro de 2016 | N° 18721 
VERISSIMO

Duas partes

Ludwig Wittgenstein, o austríaco naturalizado britânico que muitos consideram o principal filósofo moderno (morreu em 1951), publicou apenas um livro de filosofia em vida, o Tractatus Logico-Philosophicus, mas foi o autor de frases e aforismos que também ficaram. 

Ele escreveu que as fronteiras da sua linguagem eram as fronteiras do universo, e que o que se pode dizer deve ser dito claramente, o que não se pode falar deve ficar no silêncio. Mas se contradisse em um texto que escreveu sobre o seu Tractatus: “Meu trabalho consiste em duas partes, uma a apresentada no livro, outra a que eu não escrevi. E é precisamente esta segunda parte que é importante”.

Pronto: escritores e principalmente cronistas têm a bênção de Wittgenstein para sua ambição secreta, que é de serem entendidos não pelo que escrevem mas pelo que deixam de escrever.

Todos os nossos textos são tratados filosóficos, nas entrelinhas. O que aparece impresso é a apenas a parte menos importante.

Wittgenstein era um crítico feroz dos que considerava seus inferiores. Foi ele quem disse que a poesia de Rilke era venenosa e causava indigestão. Um contemporâneo do filósofo declarou que uma conversa com ele era como viver o dia do Juízo Final. Não era mole, nosso patrono.

Fui ao programa do Jô algumas vezes. Ele sempre contava que tinha ido almoçar na nossa casa em Porto Alegre e que quando me perguntou há quanto tempo morávamos ali respondi “mais de 50 anos”, e quando perguntou quantos quartos tinha na casa – eu não sabia! A primeira vez que fui ao programa do Jô ainda era no SBT e os outros convidados eram o Luiz Carlos Prestes e o Lula. 

Não sei por que eu estava naquela companhia, talvez porque também era um Luis. Enquanto esperávamos o início do programa, comentei com o Lula que era amigo do Marco Aurélio Garcia. “Grande figura”, disse o Lula. Virei para o Prestes e comentei que um tio do meu pai, Nestor Verissimo, tinha participado da Coluna Prestes. “Grande figura”, disse o Prestes. O papo não prosperou. E ainda dizem que eu não sou de puxar conversa.

O Luiz Carlos Prestes já morreu, eu ainda não, mas que fim levou o Lula?