quinta-feira, 16 de novembro de 2017



16 DE NOVEMBRO DE 2017
DAVID COIMBRA

Quem é Mugabe, o aliado de Lula

Tempos atrás, um político de oposição começou a incomodar o ditador do Zimbábue, Robert Mugabe, com críticas acerbas. Como se sabe, ditadores não gostam de críticas acerbas. Mugabe mandou seus esbirros à cabana em que morava o adversário, para lhe dar uma lição. Eles obedeceram: queimaram vivo o filho de 12 anos de idade do opositor.

Ontem, depois de se refocilar no poder por 37 anos, Mugabe foi deposto por um golpe militar. Neste período, ele acumulou muitas histórias de assassinatos, mutilações e torturas. E também algumas boas amizades. Uma delas com o nosso pai dos pobres, Lula. A proximidade dos dois era tamanha, que Lula pleiteou a realização de um amistoso da Seleção Brasileira no Zimbábue. O jogo aconteceu, às vésperas da Copa de 2010, o Brasil venceu a seleção local por 3 a 0, mas enfrentou algumas dificuldades, sobretudo com a violência dos zagueiros inimigos.

Outra prova de amizade de Lula foi sua insistência para que o BNDES abrisse uma linha de crédito ao Zimbábue. Assim, cerca de US$ 100 milhões do banco brasileiro foram derramados gentilmente no país africano. Mugabe soube usufruir dos recursos - sua festa de aniversário, comemorada em fevereiro deste ano, teve 100 mil convidados.

Muitos habitantes do Zimbábue acham que ele merece. Como todos os populistas, Mugabe tem seus bajuladores sempre a postos. Outros zimbabueanos, porém, acreditam que talvez fosse melhor investir em saúde, já que a aids é epidêmica no país. Ou em qualquer outra área que não a de festividades, já que a população do Zimbábue só não morre de fome devido à ajuda da comunidade internacional.

Suponho que Lula goste de Mugabe porque ele é "de esquerda". Chamam-no de "camarada". Mugabe, como Lula, vem de família pobre - era professor primário. Ao liderar a independência do país e assumir o poder, em 1980, esperava-se que fosse uma espécie de salvador da pátria. Os zimbabueanos sofriam, sempre sofreram.

Nos primeiros tempos da dominação britânica, o Zimbábue era chamado de Rodésia, em homenagem a Cecil Rhodes, o feitor que os ingleses mandaram para submeter a região.

Rhodes foi um monstro, um racista ideológico. Dizia que os anglo-saxões eram o suprassumo da civilização. Sua missão na Terra, acreditava, era expandir o Império Britânico como uma espécie de limpeza étnica do planeta. Seus planos eram grandiosos: pretendia traçar uma linha de trem que ligasse a Cidade do Cabo, no Sul, ao Cairo, no Norte. A África inteira viraria uma possessão inglesa. Para tanto, Rhodes escravizou milhões de africanos, colocou-os para trabalhar nas minas de sua propriedade e se tornou o dono de 90% do comércio de diamantes do mundo. Não conseguiu construir sua ferrovia nem conquistar a África, apesar de ter matado gente tentando. E como - há historiadores que calculam em 60 milhões o número de vítimas de Rhodes. Hitler, perto dele, era um escoteiro.

Você se lembra do famoso leão Cecil, que foi caçado e morto por um dentista americano idiota, tempos atrás? Pois é. Aquele leão se chamava Cecil por causa de Cecil Rhodes. Pobre leão.

Mas o que importa é que a Rodésia livrou-se de Rhodes, virou Zimbábue, passou por inúmeras vicissitudes e caiu nas mãos socialistas de Mugabe. Parecia que tudo iria bem, mas Mugabe transformou-se em tirano, expulsou ou matou os fazendeiros brancos, dizimou oposicionistas, manteve a população no atraso e conduziu a economia de forma trágica. A inflação era tão poderosa, que o país chegou a imprimir uma nota de 100 trilhões de dólares locais. Enquanto isso, o saldo bancário da nação era de 217 dólares americanos.

Ao estabelecer aliança com Mugabe e outro de seus amigos ditadores, Kadhafi, a quem chamava de "irmão", Lula declarou com solenidade:

- Não devemos ter preconceitos contra países que não são democráticos!

Preconceitos. É saudável sabê-lo: em alguns casos, é melhor tê-los.

DAVID COIMBRA