quarta-feira, 12 de junho de 2024


11 DE JUNHO DE 2024
NILSON SOUZA

Meteoros

Já faz algum tempo que brinco comigo mesmo, me considerando um dinossauro do jornalismo, do futebol e até da tecnologia - ainda que essa última analogia seja bastante questionável, pois chegamos à era digital juntamente com os jovens. Tudo bem que eles são mais rápidos com os polegares e habitam 24 horas o universo virtual. Muitos nasceram nele. Porém, depois que aprendi a lidar com o chat GPT e com a inteligência artificial, já não me considero tão analógico assim. A propósito, é bom esclarecer que sou eu mesmo o autor deste texto (embora desconfie de que os algoritmos fariam melhor).

Pois bem, deixei de ser dinossauro na semana passada. O discurso do secretário-geral da ONU, no Dia Mundial do Meio Ambiente, colocou as coisas nos seus devidos lugares:

- No caso do clima, nós não somos os dinossauros. Nós somos o meteoro - sentenciou o português António Guterres, em tom apocalíptico.

A frase de efeito é fulminante, especialmente para nós, gaúchos, que estamos emergindo de uma catástrofe climática com aquele inevitável sentimento de culpa de quem, em algum momento da vida, jogou pelo menos um papel de bala no chão. Guterres referia-se ao aquecimento global ao lembrar que o planeta se aproxima do que os cientistas já chamam de "inferno climático". No nosso caso, pelo que dá para deduzir, o maio mais quente da história da humanidade provocou um dilúvio universal sobre o Rio Grande - e, para complicar ainda mais a nossa vida, as comportas e casas de bombas não estavam devidamente lubrificadas.

Certamente ajudamos a esquentar esse maio fatídico, com a descarga de nossos carros, com a chaminé de nossas fábricas, com a transformação de florestas em descampados, com o consumo desenfreado de bugigangas e outras ações rotineiras que agridem a natureza, mas estão introjetadas em nosso cotidiano. Agora mesmo, tudo o que queremos é que retirem da frente de nossas casas os entulhos da inundação, não importa para onde levem tantos resíduos.

De certa forma, talvez sejamos realmente meteoros. Sabemos que a vida é curta e queremos aproveitar cada momento de nosso voo para fazê-lo o mais luminoso possível, ainda que possa terminar em colisão. Porém, pelo menos em relação aos dinossauros, não foi culpa nossa. Eles sucumbiram porque um asteroide atingiu a Terra, levantou uma nuvem de poeira e provocou um inverno escuro de 15 anos. Além dos simpáticos bichões, muitas espécies desapareceram. Só milhões de anos depois é que o homem, esse meteoro inteligente e destruidor, apareceu por aqui para filosofar e guerrear.

NÍLSON SOUZA

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