sábado, 15 de junho de 2024



15 DE JUNHO DE 2024
FLÁVIO TAVARES

O ARROZ NOSSO DE CADA DIA

O caos ou os desastres não podem ser fonte de corrupção. Se atingirmos essa situação já não será o caos, mas - sim- o apocalipse bíblico, que é (em si mesmo) o fim do mundo. Pior do que tudo, porém, é quando o roubo ou a corrupção se aproveitam dos desastres e neles tentam se desenvolver.

Tudo isso ocorreu agora com a tragédia das enchentes. Nos abrigos, onde centenas de pessoas buscavam proteção, surgiram larápios roubando os pertences dos que haviam perdido os bens mais valiosos nas inundações. As vítimas pensavam estar em "lugar seguro". Em verdade, haviam sido salvas apenas da fúria das águas.

Em algumas cidades, funcionários municipais superfaturaram compras que as prefeituras destinariam aos afetados. Em certos casos, os superfaturamentos chegaram a 100%. Isso não será um crime premeditado, servindo-se do desastre para roubar?

Nada, porém, supera o crime desencadeado pelo governo federal sob o pretexto de que poderá "faltar arroz", já que nosso Estado é o maior produtor, responsável por 70% de nossas necessidades. Nenhuma atenção deu o governo federal aos arrozeiros quando explicaram que praticamente toda a safra já fora colhida, sem necessidade de importar.

Mesmo assim, o governo federal fez um leilão para selecionar os futuros importadores de 263 mil toneladas de arroz para que os pacotes de cinco quilos fossem vendidos a R$ 20. Com isso, amenizariam os impactos das enchentes, aparecendo como "heróis" ao baixar o preço de algo essencial no cotidiano.

O leilão resultou num escândalo. Dos quatro vencedores, o primeiro foi uma loja de queijos de Macapá, capital do Amapá. Outro, uma fábrica de polpa de frutas de São Paulo. Outro mais, uma locadora de veículos de Brasília. Só um deles, de Florianópolis, tinha relação com importação do cereal.

A repercussão foi tão brutal que o leilão foi anulado. Tudo isso, porém, mostra que a imoralidade busca se transformar no arroz nosso de cada dia. Resta indagar: continuaremos enredados pelo horror ao permitir que a desolação sirva ao crime?

FLÁVIO TAVARES

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