20 de janeiro de 2014 |
N° 17679
ARTIGOS - Paulo
Brossard*
Atrás das grades
Graças ao avanço das comunicações
e a conivência de autoridades, criminosos dirigem as ações de dentro do
presídio para serem executadas fora dele. A administração nas penitenciárias
passa a ser feita por facções de criminosos que concorrem com o Estado, e o
resultado não é difícil antever.
Hoje, o problema não é simples
nem fácil. A população carcerária não é do melhor perfil e pode ser do menos
bom, do mesmo modo que o elemento externo nem sempre estará qualificado a
exercer as necessárias atribuições específicas que lhe cabem. Nem são ideais as
relações que, por vezes, se não muitas vezes, se estabelecem entre presidiários
e seus guardas. Enfim, não é necessário ser especialista para intuir que as
qualificações dos servidores lotados no serviço de carceragem não poderiam ser
vulgares. Se as relações entre o preso e o que deve guardá-lo são complexas, o
problema se centuplica, consideradas as condições dos presídios. De maneira
geral, são deficientes em todos os sentidos, o primeiro deles, visível a olho
nu, decorre da habitual superpopulação carcerária.
Suponha-se que o melhor hotel da
cidade, com a capacidade para receber 300 hóspedes, tivesse de acomodar 600 ou
900. É evidente que o melhor hotel instantaneamente se converteria no pior; é o
que vem ocorrendo com os presídios. A antiga Casa de Correção de Porto Alegre
foi disso exemplo ilustrativo. Claro que o problema não é insolúvel, contudo, a
primeira dificuldade está na carência de recursos financeiros e na existência
do número de necessidades a satisfazer.
É natural que o administrador
seja levado a deixar para depois a construção de um presídio que, embora
necessário, não se compara com outras obras, mais palatáveis ao gosto popular.
O fato é que, de um modo geral, em todos os Estados os presídios foram ficando
para melhor oportunidade, agravando-se a deficiente quando não a má qualidade
dos seus serviços.
Não faz muito, um titular do
Ministério da Justiça determinou fosse apurado, Estado por Estado, quando fora
construída a última cadeia e o resultado foi penoso, razão por que o ministro,
com apoio de seu presidente, se dirigiu a todos os governadores propondo-lhes
construir uma cadeia no seu Estado. O plano foi cumprido à risca, um em cada
Estado. Era o mínimo e deveria ser o começo, mas o ministro deixou o ministério
e não houve a esperada continuidade. Essas e outras dificuldades são
conhecidas, mas verificar que em alguns Estados os detentos estão amontoados é
indefensável e imperdoável. E essa desumanidade não pode continuar.
Não é só. Um fato veio
acrescentar elemento novo ao pungente quadro conhecido; entidade veio a
constituir-se aglutinando dois tipos, os condenados e por isso detentos e os
que se encontram fora do presídio, porque não condenados; aqueles planejam o
empreendimento e estes em liberdade são os executores dos planos traçados; não
demorou que um segundo grupo decidiu instalar-se na mesma área e entrou a
disputar com o anterior a primazia de sua exploração, resultando feroz
concorrência entre ambos e têm sido divulgadas notícias de eliminação por parte
de um ou outro, até mediante degola. É inacreditável.
A meu juízo, de Norte a Sul o
problema é praticamente o mesmo: basta dizer que o Estado de São Paulo abriga
40% da população carcerária do país e nove em cada 10 unidades prisionais estão
superlotadas; para 206.900 detentos, as vagas são 123.400. Isso em São Paulo.
*Jurista, ministro
aposentado do STF