10 DE JANEIRO DE 2018
ARTIGOS
À VIDA,COM AMOR
Frente a um diagnóstico preocupante e vendo a evolução de sua doença, uma jovem australiana de 27 anos escreveu uma carta de despedida. Neste final de semana, depois de sua morte, a família tornou pública a mensagem, que virou notícia e viralizou nas redes sociais. Nas "notas para antes de morrer", como ela classificou o texto, nenhum conselho inovador, nada já não dito ou extraordinário. Apenas recomendações simples de quem, por não poder mirar lá na frente, resolve olhar com mais cuidado e atenção para o hoje. Pois a vida insiste em se esconder nas frestas da rotina.
"Olhe o céu azul; respire; não se irrite com pequenos problemas; trabalhe menos; seja menos consumista e mais solidário": as sugestões de Holly Butcher vão ao encontro de tantas outras deixadas por pessoas que se confrontam com o fim da vida. Por outro lado, nunca vi relatos de arrependimento por não se ter conquistado um alto cargo em uma empresa, atingido a fama ou obtido mais bens materiais. A publicação da australiana tem 58 mil compartilhamentos e 14 mil comentários. Por que então seguimos sem ouvir esses gritos que são, na mesma medida, um alerta para os que ficam e uma última tentativa de resgate do essencial?
Como todos os clichês, a célebre frase de Antoine de Saint-Exupéry no livro O Pequeno Príncipe acabou perdendo a força, mas continua sintetizando de maneira tão profunda, singela e bonita a maioria desses conselhos. "Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos." Por isso é tão importante resgatarmos os sentimentos e as sensações. É preciso consciência, conexão e sensibilidade.
Consciência para entender e respeitar o tempo, esse senhor que nos deixa sem se despedir. Conexão com pessoas e com o afeto, na tentativa de deixar muito de nós aqui, na tentativa de levar a vida para depois do fim. Sensibilidade genuína, capaz não apenas de nos emocionar com um texto como o da australiana, mas também de, a partir dele, nos fazer mudar conceitos.
Neste início de ano, acredito que podemos nos inspirar na história de Holly. Não para escrever notas antes da morte, mas uma carta de compromissos à vida.
Jornalista comamorvirgula@gmail.com - THAIS ZANCHETTIN