19 DE JANEIRO DE 2018
CAPA
No calor das emoções
ME CHAME PELO SEU NOME, um dos mais elogiados filmesda temporada, ilumina fugaz romance entre dois jovens em região rural do norte da Itália.
Premiado em 2017 pelas principais associações de críticos de cinema dos Estados Unidos, entre elas as de Nova York e Los Angeles, Me Chame pelo seu Nome, chegou aos cinemas brasileiros. E está cotado para aparecer em ao menos quatro categorias no anúncio dos indicados ao Oscar, na próxima terça-feira. Com o brasileiro Rodrigo Teixeira entre os seus produtores, o longa do diretor italiano Luca Guadagnino (de Um Sonho de Amor e Um Mergulho no Passado, ambos com Tilda Swinton) é baseado no livro homônimo de André Aciman (leia mais na página 4) e foi roteirizado pelo cineasta veterano James Ivory vencedor do prêmio de melhor roteiro adaptado no Critics Choice Awards.
O grande trunfo do filme, entretanto, é a interpretação corajosa dos atores, o americano Armie Hammer, 31 anos, e o americano filho de pai francês Timothée Chalamet, 22 anos, que deve aparecer na lista dos indicados a melhor ator no Oscar - concorrendo no Globo de Ouro e no Critics? Choice Awards, ele acabou vendo Gary Oldman receber as honrarias por seu trabalho em O Destino de uma Nação. O rapaz atuou também em Lady Bird: A Hora de Voar, outro provável candidato ao Oscar e vencedor do Globo de Ouro de melhor filme cômico, e no novo longa de Woody Allen, A Rainy Day in New York, em pós-produção.
Em Me Chame pelo seu Nome, o ator promissor vive Elio Perlman, um rapaz no final da adolescência que passa o verão ao lado da família em uma casa de campo em uma região bucólica no norte da Itália - para o papel, Chalamet teve de aprender a tocar piano e falar italiano. O ano é 1983, quando a aids, que passaria a ser chamada de câncer gay, ainda não causava pânico entre os homossexuais; era um tempo sem internet e smartphones, em que as paqueras rolavam apenas no olho no olho, com mais chances de florescer um romance sem roteiro pré-definido.
Ainda hesitante quanto à sua sexualidade, Elio, um jovem culto de 17 anos, passa os dias lendo, tocando música clássica e divertindo-se com os amigos. Sua pacata rotina será alterada com a visita de Oliver (Hammer), estudante americano que trabalha em seu doutorado e chega para ajudar o pai do garoto (Michael Stuhlbarg), um intelectual que estuda a antiguidade. Como aluno-visitante, Oliver participará do dia a dia da família durante seis semanas.
Num primeiro momento, Oliver, com sua postura esnobe, se mostrará indiferente às tentativas de aproximação de Elio, que, insistente, acabará chamando a atenção do visitante principalmente por seu apuro intelectual e dotes musicais. Embalados por uma trilha sonora saudosista, com canções emblemáticas do começo dos anos 1980 - entre elas, Paris Latino (Bandolero), Lady Lady Lady (Giorgio Moroder/Joe Esposito) e Love My Way (The Psychedelic Furs) -, os dois vão acabar se aproximando nos últimos dias da viagem do doutorando.
Se indicado ao Oscar, como as previsões apontam, Me Chame pelo seu Nome, que pode ganhar uma sequência, será o filme representante da comunidade homossexual, que se viu frustrada após o descaso da Academia com o elogiado 120 Batimentos por Minuto, sobre a epidemia da aids na França nos anos 1990 - o longa ficou fora da lista de pré-selecionados à estatueta de filme estrangeiro.
Mas a obra de Guadagnino, apesar das altas doses de testosterona, não pode ser resumida a um "longa para gay ver". Reprovado por alguns críticos por mostrar um romance em meio a um cenário de perfeição - com direito a belos corpos à mostra em banhos em riachos e lagos - e também por apresentar dois homossexuais pouco afeminados (ou seja, de fácil aceitação pelos héteros, ao estilo de O Segredo de Brokeback Mountain), a produção quer, ao isolar um relacionamento em uma atmosfera livre de problemas, discutir o que, ao olhar das personagens, seriam "as coisas que realmente importam" - e a consequente dificuldade de se lutar por elas após serem identificadas. É acima de tudo um trabalho sobre a coragem de se viver uma grande história amorosa. Ou sobre o medo de encará-la, mesmo que os melhores ventos estejam soprando a favor.
rafael.balsemao@zerohora.com.br - RAFAEL BALSEMÃO