O QUE A SOLIDÃO PROVOCA NO CORPO
O ISOLAMENTO SOCIAL NÃO ESCOLHIDO COLOCA O CORPO EM ALERTA E PODE FAZER TÃO MAL QUANTO O CIGARRO E A OBESIDADE. ESTUDO NORTE-AMERICANO MOSTROU QUE A SOLIDÃO AUMENTA A MORTALIDADE EM CERCA DE 30%. VEJA OS EFEITOS.
Inflamação crônica
O sistema neuroendócrino normalmente libera substâncias inflamatórias no organismo, uma forma de preparar o sistema imunológico para o perigo. Mas a solidão agrava o processo e contribui para oxidar (envelhecer) as células e aumentar os riscos de desenvolver síndrome metabólica (desregulação na metabolização de gorduras pelas células). São fatores de risco para diabetes, câncer e até Alzheimer.
Declínio cognitivo
O aumento no nível de hormônios do estresse, como cortisol, adrenalina e noradrenalina, pode, no longo prazo, prejudicar a memória.
Envelhecimento precoce
Pequenas "capas de proteção" no fim das moléculas de DNA, os telômeros encurtam conforme as células se multiplicam. A ciência sabe que o estresse acelera o encurtamento dessas "capas" e envelhece as células mais rapidamente.
Doenças cardiovasculares
Estudo publicado em 2015 no conceituado jornal Heart mostrou que o isolamento aumenta os riscos de doença coronária do coração em 29% e de infarto em 32%. É que os hormônios do estresse também regulam a circulação sanguínea. Elevados, promovem danos nas paredes de artérias, fator de risco para aterosclerose, e aumento da pressão arterial. Além disso, promovem a liberação de mais gordura e açúcar no sangue, o que está relacionado a diabetes.
Sono ruim
Como se ficássemos em alerta após nos separarmos da tribo, o corpo libera mais cortisol durante o dia, o que piora a qualidade do sono, importante para a produção adequada de hormônios.
Sistema imunológico deficiente
Há estudos indicando que pessoas solitárias sofrem mais de doenças cardiovasculares, como câncer e infecções. Uma das explicações seria que o corpo suprime a expressão de genes ligados à atuação do sistema imunológico, de forma a reduzir a produção de leucócitos.
Excesso de peso
Sobretudo na adolescência, o isolamento está relacionado ao sobrepeso, uma vez que são nesses momentos que investimos em junk food. Em idosos, é fator de risco para controle da hipertensão.
Paranoia
O estado de vigilância constante que ficamos devido ao isolamento muda a forma como interpretamos a realidade. Desenvolvemos uma tendência maior a encarar o outro como ameaça e, na prática, reduzimos ainda mais o contato social.
A CIÊNCIA DO AFETO
A plenitude depois de um churrasco em família, uma noite com os amigos ou o voluntariado se explica por uma liberação em cascata de substâncias no cérebro. Um dos mais marcantes é a oxitocina, o "hormônio do amor". Produzido na hipófise, ela atua como um calmante e gera aquela sensação de estar conectado.
Há a hipótese de que o contato social iniba o hipotálamo posterior, zona responsável pela secreção de hormônios do estresse, ligados ao aumento da pressão arterial e à aceleração de batimentos cardíacos. Ao mesmo tempo, elevam-se os níveis de endorfina, analgésico natural ligado ao prazer, e de neurotrofinas, proteínas que estimulam o surgimento e a sobrevivência de neurônios.
- O estímulo cognitivo também está relacionado com ações sociais. O velhinho que se diverte e ri estimula a memória durante a conversa, se esforça para entender o argumento do outro. É um jeito também de se proteger contra o Alzheimer - afirma a neurocientista Mônica Vianna, pesquisadora de longevidade e professora na Escola de Ciências da PUCRS.
Mais do que isso, relacionamentos nos conferem posições sociais dentro de um grupo e contribuem para a manutenção de uma autoestima saudável. Esse senso de propósito - estar conectado a algo maior - é apontado por analistas como essencial para nossa saúde. Estudo britânico publicado no Journal of Epidemiology and Community Health mostrou que quem tinha mais amigos aos 45 anos relatava mais bem-estar aos 50.
Isso é especificamente importante para idosos, que podem se sentir sem rumo após a aposentadoria e por se tornarem dependentes da família devido a doenças. A reconexão com um bem comum pode se efetuar com o cuidado dos netos, o preparo das refeições em família ou atividades lúdicas, como jardinagem. Esse propósito é marcante nos centenários que vivem nas zonas azuis espalhadas pelo mundo (Okinawa, no Japão, Sardenha, na Itália, Nicoya, na Costa Rica, Icaria, na Grécia, e Loma Linda, nos Estados Unidos).
Agora, se você é o tipo de indivíduo que adora estar sozinho, em silêncio, ao fim do dia, fique tranquilo. Há uma diferença entre a solitude, um afastamento voluntário para refletir e se conectar consigo mesmo, e a solidão, que é o isolamento social no momento em que se anseia por contato.
- A conexão é o que dá sentido à nossa vida. "Mas e o monge budista?", podem perguntar. Bom, ele tem um preparo e buscou um isolamento. E mesmo assim ele se sente conectado, via meditação. Basta ouvir o Dalai Lama falando - diz o psiquiatra Diogo Lara.
Todos esses benefícios, no entanto, ocorrem apenas em relacionamentos saudáveis. Laços sociais tóxicos fazem mal, podendo afetar nossa autoestima. Portanto, escolha bem quem ficará ao seu lado e monte sua "aldeia", como propõe a psicóloga Susan Pinker. Se a escolha for boa, você viverá nela por muito tempo.
DICAS PARA CONECTAR-SE MAIS
Se sua rotina é atribulada, foque em almoços: o intervalo para comer é obrigatório mesmo, então, por que não fazê-lo com alguém que você não vê há um tempo?
Não troque o encontro ao vivo pela interação digital.
Faça uma lista de pessoas que você quer ver regularmente. O encontro não precisa exigir grande preparação nem durar horas a fio. Se você ficaria uma hora na rua esperando um compromisso, que tal aproveitar para um café com um amigo?
Cultive relacionamentos no trabalho. Estudos mostram que quem tem amigos na empresa é mais realizado profissionalmente e, inclusive, rende mais. Invista no cafezinho na cozinha da firma.
Deixe o celular no bolso enquanto você está com alguém. O cérebro presta menos atenção na conversa se existe a possibilidade de você mudar o foco para uma notificação de aplicativo. Com isso, o engajamento e a empatia são menores.
Foque em atividades de lazer de acordo com seus interesses. Clubes de leitura, grupos de corrida, voluntariado e reuniões para debate são boas formas de conectar-se a um propósito comum ao lado de outros.
Seja um bom ouvinte. Escute o problema do outro e não o compare com o seu. Cada um sente a dor de uma forma peculiar, que tem sua importância. Se o ouvinte diz que enfrenta um obstáculo, não responda "Pelo menos você tem...". Invista em: "Como isso te incomoda?". Às vezes, o importante não é ouvir uma resposta, só falar já ajuda.
Foque em refeições em família. Para crianças, é um bom momento de incrementar o vocabulário.
Fontes: Mayo Clinic e Mental Health America