quarta-feira, 26 de agosto de 2015



26 de agosto de 2015 | N° 18274
EDUCAÇÃO BONS SONHOS BOAS NOTAS


AS AULAS DA MANHÃ COMEÇAM MUITO CEDO?

ESPECIALISTAS AFIRMAM que iniciar as atividades escolares logo nas primeiras horas do dia prejudica a qualidade do sono e o rendimento de crianças e adolescentes
O verbo estudar está tão presente na realidade de crianças e adolescentes brasileiros quanto outro de mesma terminação: madrugar. Com o início das aulas nas primeiras horas da manhã, o modelo que impera nas escolas seria prejudicial às horas de sono e, consequentemente, ao desempenho escolar. A conclusão é de um relatório sobre o tema divulgado no início deste mês pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos.

Segundo o documento, apenas uma em cada seis escolas americanas de Ensino Fundamental e Médio começa as aulas às 8h30min ou depois, horário recomendado pela Academia Americana de Pediatria. Pelo menos dois terços dos adolescentes não dormem a quantidade de horas – nove – considerada o suficiente. No Brasil, a situação é parecida. As aulas geralmente se iniciam próximo das 7h30min e há relatos de problemas com o sono.

– É uma dificuldade que enfrentamos aqui também. Os horários, como estão organizados hoje, não permitem aos estudantes durmirem o que precisam de verdade. Não é apenas porque eles não querem dormir mais cedo. Tem uma tendência biológica envolvida – afirma Fernando Louzada, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e especialista na ciência do sono e suas relações com a aprendizagem e o desempenho escolar.

Um levantamento do Instituto de Pesquisa e Orientação da Mente, realizado em parceria com o Instituto Sou +Jovem, mostrou que 43% dos entrevistados brasileiros, com idades entre 14 e 18 anos, dormem de três a cinco horas por noite. O pouco tempo de descanso poderia levar ao baixo rendimento escolar, ao excesso de peso, a alterações de humor, à intensificação da hiperatividade, à dificuldade de concentração e fixação do conteúdo e a comportamentos de risco, como uso de drogas e álcool.

NO BRASIL, TEMA É NEGLIGENCIADO

Para o pediatra Gustavo Moreira, pesquisador do Instituto do Sono, de São Paulo, não é novidade que o formato atual tem efeitos prejudiciais para crianças e adolescentes. A comunidade científica estuda o assunto há pelo menos duas décadas e já chegou a conclusões sobre o tema.

– Há várias pesquisas que mostram que atrasar os horários melhora o desempenho escolar. Isso já é sabido, não é de agora. Mas esses estudos acabam tendo mais ênfase fora do país. Uma mudança envolveria uma estratégia ampla, e há dificuldades – ressalta Moreira.

Da área médica à pedagógica, especialistas reconhecem a necessidade de uma reflexão mais aprofundada sobre o tema nas escolas brasileiras. Tania Marques, professora de psicologia da educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), entende que o assunto é negligenciado em todos os âmbitos sociais.

– Muitas pesquisas não têm sido levadas adequadamente em conta. Há tanta coisa que está acontecendo na educação que essa questão do sono acaba sendo relegada. Eu não vejo argumentos pedagógicos para não defender as aulas mais tardias. É questão de saúde – diz Tania.

nathalia.carapecos@zerohora.com.br