11 de agosto de 2015 | N° 18256
LUÍS AUGUSTO FISCHER
A GRÉCIA AQUI
O hino riograndense, aquele que fala de nossas excelsas virtudes que deveriam ser tomadas como exemplo pelo mundo todo, e que tanto o pessoal gosta de cantar hoje em dia, teve uma estrofe suprimida, parece que em 1966, sob a ditadura militar. Ela dizia: “Entre nós reviva Atenas/ para assombro dos tiranos/ Sejamos gregos na glória/ e na virtude, romanos”.
Lembrei disso ao ler a entrevista do ex-secretário da Fazenda gaúcho Aod Cunha, que serviu ao governo do PSBD. Disse ele, cá na Zero Hora, no domingo dia 2 de agosto, numa extensa entrevista: “O Rio Grande é a Grécia sem os países ricos do euro para ajudar”. Ele não sugeriu que devemos ser a Grécia gloriosa, mas que somos já a Grécia da crise atual, que a Europa e o mundo todo acompanham com apreensão.
Sinceramente, pensei que o ex-secretário, sujeito visivelmente culto e articulado, ia pedir revisão da entrevista. Pensei que, ao ver estampada a frase que reproduzi, ele ia dizer com seus botões: “Bá, me passei. A frase é uma imbecilidade”. Então pediria perdão aos leitores. Mas não. Tanto quanto pude acompanhar, ele não se arrependeu da frase, que no entanto é inadmissível para um intelectual como ele. Por quê?
Por um motivo fácil de enunciar, e que não sei como escapou ao ex-secretário. Comparar o Rio Grande do Sul, província constitucional de um país, a um país autônomo que há meia dúzia de anos ingressou numa organização supranacional ainda mal organizada, é uma desproporção descabida.
O único sentido em que as coisas poderiam ser aproximadas é aritmético, que aponta para a diferença entre entradas e saídas de dinheiro. Fora isso, tudo é diferença – o tamanho da história da Grécia e do Rio Grande do Sul e do Brasil, assim como suas economias atuais, sem ir mais longe.
Mas eu preciso ir mais longe: a frase profundamente equivocada do ex-secretário simplesmente apagou o abismo que separa um país, um estado nacional, com sua autonomia e sua história, de uma província, com sua fatal subordinação a um governo central (e centralista). Em suma, o que o ex-secretário quis apagar, com sua frase inepta, foi a política – como, aliás, têm feito todos os intelectuais e operadores da lógica que a entrevista expressa, sob um aspecto de neutralidade que não existe.