sábado, 26 de janeiro de 2019


26 DE JANEIRO DE 2019
CARPINEJAR

Chuva de arroz


O que tem no saleiro? Sal, dirá o mais apressado. Apesar da obviedade, o saleiro guarda grãos de arroz, que tiram a umidade, desfazem as bolas salinas e facilitam a saída do conteúdo.

Poucos percebem a importância do arroz para salgar a comida e não deixar ninguém pagando o mico de bater o pote histericamente na mesa, de um lado para o outro, a fim de desentupi-lo. Ele é essencial, mas invisível. Não obtém a simpatia, mas segura a barra.

Na relação, sempre destacamos o sal da vida, o sonhador, o louco, o visionário, o que não se limita à realidade. Não valorizamos em nada o arroz, aquela figura que enquadra o par, inspirando-o a colocar os pés no chão e concretizar os seus projetos um de cada vez.

Longe do arroz, o sal não sai. Desfalcado de uma pessoa mais objetiva e prática, o casamento não funciona, não será realizada coisa alguma. Haverá apenas rompantes e grandes ideias vazias. As fantasias desaparecerão com o tempo como meros impulsos.

O sal tempera a convivência com a sua criatividade e ousadia. O arroz possibilita que o sal crie condições para que venha à tona e se torne popular.

O sal inventa e não calcula as consequências. O arroz executa planilha Excel de todo gasto e evita dívidas. O sal prefere delirar; o arroz, pensar dentro do possível. O sal privilegia a intensidade; o arroz, a estabilidade. O sal quer o sucesso rapidamente, o arroz monta um plano de ação a longo prazo. O sal é a aventura, o arroz é a serenidade. O sal é destemido, o arroz é cauteloso. O sal é a superfície, o arroz é a base.

Os preconceitos recaem sobre o arroz, visto negativamente como o chato do casal. Tanto que a esposa ou o marido realista é chamado ironicamente pelos demais de "sem sal", já que ocupa o papel difícil da verdade dentro de casa e não esquece o lado ruim de qualquer quimera. Põe defeitos, previne os riscos e estraga o prazer do momento com conversas sérias sobre a longevidade de uma nova panaceia.

Porém, desprovido do arroz, o sal não será conhecido, não chegará à luz do sol, não atiçará a gula de ninguém.

Parece que brilhante é só o sal, jamais o arroz, que surge como um freio da espontaneidade.

O que não se pode esquecer é que, na saída da igreja, os noivos recebem uma chuva de arroz. Um sinal de que amor é esforço e de que a sua sorte depende de quem trabalha e refina o fluxo na sombra.

CARPINEJAR

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