segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019


18 DE FEVEREIRO DE 2019
CLÓVIS MALTA

A cidade imaginada

Se tivéssemos a oportunidade de desenhar a cidade, como pedem na escola para algumas crianças privilegiadas pelo estudo, como a idealizaríamos? Talvez começássemos pelas praças infantis. Andam tão feias. A pintura descascou faz muuuito tempo - quase na época da bruxa horrorosa. E os brinquedos, coitados. É como se o lobo mau tivesse destruído tudo. Que feio.

O que os meninos e meninas de hoje vão pensar amanhã de nós, adultos, se deixarmos tudo como está? E crianças crescem rápido. Quando a gente vê, ó: já querem dar ordens.

Seria legal rabiscar água jorrando das fontes, dos chafarizes. São obras de artistas que deveriam estar nos livros didáticos, criadas para lavar a alma de quem passa. Um pouco de vida nas floreiras, riscando com o giz de cera deitado, também ajudaria a melhorar o astral de todo mundo. Umas flores com cores. Umas cores com flores. Umas calçadas com acessibilidade. Quadros com informações gentis sobre onde estamos e que opções temos pela frente na nossa jornada.

Quem sabe poderíamos desenhar contêineres limpos, sem lixo em volta? Os moradores e o pessoal da reciclagem atentos, sendo orientados a usá-los de forma adequada. Todo mundo passando sem pressa, pronunciando pausadamente cada sílaba da palavra de-va-ga-ri-nho, combinando-a com os passos. Sem esse tipo de preocupação desnecessária com a sujeira, toda hora, dia após dia, infinitamente. Até quando?

Daria até para rabiscar um perfume bom ao redor. As crianças sabem como se faz. Um aroma de alfazema no ar. Umas borboletas voando.

Alguns talvez desenhassem menos prédios e mais morros, como os que estão por trás deles, escondidos. Mais trens e menos carros. Muitos barcos no lago-rio Guaíba, bem à mostra. Outros fariam casas e edifícios sem nada de pichação, pintados com os mesmos tons das praças. Um céu sem nada de fios pendurados nos postes. Só o sol amarelão, umas nuvenzinhas contentes. Um horizonte bem amplo, para que se possa refletir sobre a vida mirando longe, não o prédio do lado.

Daria até para tentarmos a lápis uns bebedouros funcionando, com água gelada. Um cãozinho matando a sede bem na base do equipamento, feliz por ter sido lembrado com um recipiente próprio. Muito abrigo com banho quente para quem não tem casa. Muitos espaços de recolhimento de roupas e utensílios para quem precisa. Mais árvores ainda, com frutas, sombra e pássaros para todos. Redes públicas de wi-fi. Faixas de segurança que não pareçam ter sido apagadas com borracha.

Fica um desenho bem bonito. As pessoas com suas roupas floreadas, balançando os cabelos em tranças. As mãos enormes, compassivas. Os ciclistas vestidos de verde. Os patinadores de vermelho mais amarelo e azul, que dá marrom. Os skatistas de violeta, que vem do azul com o vermelho...

Se nos dessem uma cartolina e lápis de cor, poderíamos retratar a cidade bem como gostaríamos, e mentalizar para que se tornasse assim. Que se transformasse num local bem cuidado, no qual seríamos felizes como crianças.

Não tem quem possa garantir que dê certo. Mas, se ninguém tentar, como saberemos? Se ninguém tentar, como vamos realizar o sonho imaginado?

CLÓVIS MALTA

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