quinta-feira, 29 de novembro de 2012



29 de novembro de 2012 | N° 17268
ARTIGOS - Roberto Velloso Eifler*


A RS-010 e o cidadão comum

Eu sou um médico, mas um médico comum, que atende pessoas comuns. Trabalho em Porto Alegre e me surpreendo com o número de pessoas que vêm diariamente da Região Metropolitana, via BR-116, consultar aqui. É gente de Canoas, Esteio, Sapucaia, São Leopoldo etc. Gente comum, como eu.

São bancários, marceneiros, costureiras, comerciantes, funcionários públicos, empreiteiros, eletricistas etc. Um mundo de pessoas comuns cujos pequenos trabalhos, entretecidos, fazem o Rio Grande do Sul funcionar. É o Rio Grande que trabalha. Essas pessoas há anos perdem tempo, perdem dinheiro, perdem a paciência nos longos engarrafamentos da BR-116.

A pressão do senso comum fez com que os políticos da Região Metropolitana começassem a dar apoio ao projeto do prolongamento da RS-010 entre Sapiranga e Cachoeirinha. Isso já faz dois anos e meio. Dois anos e meio de sofrimento, atrasos, prejuízos.

Finalmente chegou-se a um modelo de parceria público-privada com a Odebrecht, referendado pela Associação de Municípios da Grande Porto Alegre. Nós, as pessoas comuns, nos enchemos de esperança. Mas eis que surge um impasse: o governo do Estado parece não gostar de parcerias público-privadas.

Eu, como médico, disponho de um conhecimento especializado, mas meu maior conhecimento é o senso comum que divido com as demais pessoas. Esse conhecimento comum enxerga como necessidade óbvia, urgente, a construção da RS-010. Não nos interessa se é projeto público, privado ou público-privado.

Não temos preconceitos intelectuais. Queremos obras. Se não gostam da Odebrecht, chamem a Delta. Não interessa. Pela Lei de Simonsen, vai sair mais barato ter a estrada pronta, seja qual for o preço, do que arcar com o custo anual de R$ 624 milhões por cada hora de engarrafamento na BR-116, segundo estudo da Agenda 2020.

O que, porém, começa a assustar é que a questão parece ser menos financeira do que ideológica. Na cúpula do governo do Estado há muitos intelectuais. Isso é preocupante. Intelec- tuais são pessoas cuja atividade profissional gira em função de ideias. Ora, ideias como conhecimento especializado não são definitivas nem consensuais, porque lhes falta verificação empírica. Conhecimento intelectual especializado não tem nada a ver com prática administrativa.

Ao longo da História, toda vez que tentaram impor ideias aos fatos, aconteceram desastres. George Orwell disse que algumas ideias são tão estúpidas, que só um intelectual para acreditar nelas. Parece-me um exagero retórico. Mas a cautela recomenda que os intelectuais sejam mantidos afastados da gerência.

De qualquer modo, nós, cidadãos comuns, sofredores da BR-116, só queremos uma coisa: que se construa a RS-010. Com parceria ou sem parceria, com intelectuais ou sem intelectuais. Logo. Sem enrolação.

*MÉDICO