RUTH DE AQUINO
10/01/2014 19h57
Você está “nervosinho”?
Na construção de um Brasil mais
justo, consciente e ético, há críticos de todas as colorações
O ano de eleição e Copa começa
com um aquecimento brutal dos ânimos e das temperaturas. O nervosismo nada tem
a ver com ideologia, mas com o contínuo desrespeito à cidadania e aos direitos
humanos. E com o assalto impune aos cofres públicos. Tem a ver com o deboche de
sonsos poderosos que dão desculpa esfarrapada e nos tratam como otários. Erra
quem insiste em rotular esse debate de um confronto entre direita e esquerda.
Na construção de um Brasil mais justo, mais consciente e mais ético, há
críticos de todas as colorações. À exceção do alvissareiro desemprego a apenas
4,6%, eis três motivos para ficar nervosinho na virada de ano.
1. O IOF sobre compras no
exterior em cartão pré-pago. O governo meteu escandalosamente a mão no bolso do
turista. Com essa conversa fiada de “equiparar imposto do cartão de débito ao
de crédito” em compras no exterior, começa a “argentinização” de nosso consumo.
É perigoso. Os argentinos fazem de tudo para driblar o cerco fiscal de Cristina
Kirchner a seu direito sagrado de lazer e se livrar do dólar paralelo. Eles
precisam comprovar renda e ter nas mãos o bilhete de viagem para comprar dólar
oficial – e, mesmo assim, o governo limita.
No Brasil, a alta do IOF de 0,38%
para 6,38% nos cartões pré-pagos pune sobretudo a nova classe média. E provoca
uma procura recorde por dinheiro vivo para viajar. Resultado: o dólar turismo
chegou, no Rio, a R$ 2,52, na quinta-feira. E por que tudo isso? O ministro
calminho Guido Mantega explica: “Os gastos com cartão de turistas brasileiros
estavam muito elevados lá fora”. É de lascar. Antigamente, comprava-se pouco no
exterior porque tudo era mais caro lá.
Podíamos ser nacionalistas no
consumo. Hoje, compra-se mais no exterior porque nossos preços estão
absurdamente altos e com qualidade bem mais baixa. O ministro Mantega agora
promete: “Não vamos estender o IOF para compra de moeda estrangeira”. Deixou
todo mundo nervosinho com essa declaração. O mercado e os consumidores.
2. O Maranhão do clã Sarney.
Sabemos que Roseana teve uma grande escola em casa. Mas criticar a divulgação
do vídeo com a barbárie no presídio de Pedrinhas e dizer que a violência nas
ruas de São Luís se deve ao aumento da população porque o “Estado está mais
rico”... É demais. Será que a governadora acha que o índice de analfabetismo
funcional no resto do país é o mesmo do Estado que ela governa, sempre na
rabeira do IDH nos quesitos sociais?
“O Maranhão está indo muito bem”,
diz Roseana, seguindo fielmente as aulas do pai José Sarney. “Nosso sistema de
saúde é muito bom para os presos.” Para os decapitados, os mutilados ou os que
fazem suas necessidades uns sobre os outros? Roseana detesta que se fale em clã.
“Não existe família. Eu sou a governadora. Quem manda aqui não é a família, sou
eu.” Que se decrete então uma intervenção exemplar no Maranhão de Roseana. Não
só nos presídios horrendos, mas nas escolas que condenam as novas gerações à
inaptidão.
Uma apuração rigorosa das contas
de Roseana também seria útil, para saber onde toda essa riqueza do Maranhão foi
investida. A governadora suspendeu, por enquanto, a licitação para as
geladeiras oficiais. Seu cardápio incluía 80 quilos de lagosta fresca, 2 toneladas
e meia de camarões frescos grandes com cabeça, 120 quilos de bacalhau do Porto,
quase 1 tonelada de sorvete em oito sabores... E por aí vai. Roseana deixa os
maranhenses nervosinhos.
3. O amadorismo do Brasil em
planejamento, prazos, fiscalização e punição. Esse amadorismo leva cidadãos,
contribuintes e eleitores a descrer do sistema e a imitar péssimos exemplos.
Ser o país que mais atrasou uma Copa do Mundo... não ter chegado sequer à
metade das obras nos estádios das cidades sedes... não ter conseguido melhorar
a maioria dos aeroportos... o vexame deixa todo mundo nervosinho. Enfrentar
falta de luz e de água num verão escaldante deixa o brasileiro nervosinho. Ver
a Baía de Guanabara, as praias e as lagoas com manchas imensas de poluição e
cheiro insuportável de esgoto, num Estado que investiu em saneamento apenas
16,8% dos recursos em 2013, deixa os cariocas nervosinhos.
Ver em São Paulo a deterioração
dos serviços públicos e a proliferação de acampamentos de sem-teto, como o Nova
Palestina, na Zona Sul da capital, com 8 mil famílias e lista de espera, deixa
os paulistanos nervosinhos. Ver um presidente do Senado pegar um jatinho da FAB
para implantar cabelo... e depois achar que resolve tudo devolvendo parte do
dinheiro, sem pedir desculpas e fingindo-se de desinformado, deixa o eleitor
bem mais do que nervosinho. A descompostura e a impunidade de Renan Calheiros
deixam o eleitor irado. Entra ano, sai ano, e o herdeiro político de Sarney não
aprende. Ou é a gente que não aprende?