30 DE OUTUBRO DE 2017
ARTIGO
O MONGE REBELDE
O monge tornara-se popular em toda a Alemanha. Surgido do nada, ele fascinara os alemães com sua coragem e destemor. Tornou-se, num relâmpago, herói nacional (na época, a nação estava dividida em 240 Estados). Ele repudiara a venda das indulgências, a compra de lugares no céu, próspero negócio estimulado pelo papado e pela casa bancária dos Fugger. Para Lutero, nem o Sumo Pontífice ou qualquer outro comissário agindo em seu nome tinha legitimidade para tal ação nefanda.
Encerrado o debate, o monge, que negou retratarse, afirmou que por ali ficava. Não tinha mais nada a dizer, e que Deus o protegesse. De fato, assim se deu, pois o príncipe-eleitor Frederico o Sábio lançou seu escudo protetor e os cavaleiros alemães, com suas espadas, asseguraram-lhe a vida, levando-o em segredo para o castelo de Wartburg, na Turíngia (onde Lutero começou a verter o Novo Testamento para o alemão). Evitaram assim que ele tivesse o triste destino de tantos outros reformadores que terminaram seus dias na fogueira.
O monge rebelde afirmava que a salvação só poderia se dar na relação direta do fiel com Deus. Acusou o papado de usurpar os antigos costumes das comunidades cristãs. De nada serviam as boas obras, as intervenções sacerdotais, os santos, a confissão ou qualquer outro recurso clerical que pudesse ser um sucedâneo à manifestação da vontade divina. Lutero tinha como modelo as comunidades cristãs primitivas, nas quais os fiéis escolhiam o seu guia espiritual.
O humanista Erasmo de Rotterdam percebeu as arrasadoras implicações mais profundas da rebeldia do monge e pediu que a Igreja Romana agisse com tolerância. Apelo tardio. Um crescente ódio tomou conta da cristandade e olhos sanguinários conduziram à Grande Guerra de católicos contra protestantes, infelicidade que se arrastou até a Paz de Westfália, em 1648.
Historiador chillin@terra.com.br