sexta-feira, 29 de dezembro de 2017


29 DE DEZEMBRO DE 2017
ARTIGOS

PRESENTE DE FIM DE ANO


E que bela a obra dedicada à Montaigne! As letras em Baskerville monotipo dão nitidez e brilho ao texto. E a qualidade do papel oferece ao tato prazer especial.

Capa e contracapa em Colorplan pristina branco, dobradas à francesa, proporcionam ao leitor uma delicada firmeza, criando espaço para valiosas informações sobre a edição.

A ilustração de capa é em monocromo, branco e preto, assinada por Salvador Dalí, inspirada em imagem de Ensaios de Michel de Montaigne, obra publicada em 1947.

Impressionou-me no relato de Zweig a parte em que Montaigne intervém como conselheiro de ambas as partes, no embate entre o rei Henrique III, católico, e o líder huguenote, Henrique de Navarra.

Montaigne convence o protestante Navarra, que recém dizimara as tropas do rei católico, a converter-se ao catolicismo. Evita-se, assim, um derramamento de sangue e garantem-se séculos de paz e glória à França.

Navarra torna-se depois rei Henrique IV de todos os franceses, oferecendo a Montaigne um importante cargo, acompanhado de altíssimo salário. Mas o pensador recusa.

Escreve ao novo rei: "Nunca recebi vantagens materiais por favores prestados a quaisquer líderes. Nunca os pedi, nem os mereci. Igualmente, jamais solicitei pagamento por serviços que me foram contratados. E vejo que sou rico como poucos o sonhariam".

Segue: "Tive oportunidades como nenhum outro as teve, mas nunca pus a mão no que não me pertencia. Tampouco pedi algo a alguém sem dar remuneração condizente. Ainda assim, faço juízo próprio das leis, dando-me por condenado".

Ninguém antes ensinara Navarra a refletir sobre a generosidade e o perdão: "Um grande conquistador deve sentir orgulho ao dar aos inimigos, a quem subjuga pela força, a chance de amá-lo como fazem os amigos".

Neste dezembro, os brasileiros lançam um olhar triste, na busca de um rasgo de céu azul para o país que amamos. Sobre mim, a arte outra vez exerceu o poder da esperança. Ler Montaigne foi o bálsamo que deu-me Stefan Zweig como presente de fim de ano.

GILBERTO SCHWARTSMANN Médico e professor gilberto.ez@terra.com.br