11 DE JULHO DE 2018
FÁBIO PRIKLADNICKI
DISCUTINDO COM ROBÔS
Um dos episódios mais marcantes dos anos 1990, especialmente para quem era jovem, foi a derrota de Garry Kasparov para o Deep Blue. O mago russo do xadrez havia batido o computador da IBM em 1996, mas tombou no ano seguinte frente a uma versão melhorada do programa. Aquilo mexeu com a cabeça das pessoas ao alimentar a velha fantasia, muito explorada pela ficção científica, de que as máquinas um dia dominariam o mundo.
Bem, ainda não dominaram, mas transformaram radicalmente nossas vidas. Vinte anos depois, os robôs são capazes de coisas ainda mais surpreendentes. O projeto Duplex, da Google, programou vozes que conseguiram marcar um horário em um salão de beleza e reservar uma mesa em um restaurante. Os interlocutores nem desconfiaram que estavam conversando com um produto da inteligência artificial, pois as vozes em nada lembravam aquela dicção mecanizada e meio tosca a que estamos acostumados. Agora, os sistemas têm um timbre agradável e imitam as imperfeições do discurso humano, como os "ãhns", as pausas e as interrupções.
Uma tecnologia que marque um compromisso para nós em um dia turbulento é certamente uma invenção bastante útil. Mas nada que poupe tanto tempo quanto outra novidade: a promessa de que um dia a tecnologia vai discutir com outras pessoas - ou outros robôs - no nosso lugar. O Project Debater, da IBM, exibiu recentemente, em San Francisco, um computador que argumentou com seres humanos sobre subsídios para a exploração espacial e o uso da telemedicina. Alimentada por centenas de milhares de estudos sobre os temas, o programa surpreendeu o público presente com sua performance.
Ainda é difícil antever o uso preciso que daremos a esse recurso, mas já fico imaginando como beneficiaria as pessoas que se desgastam emocionalmente em longas e improdutivas discussões nas redes sociais. Pense na quantidade de louça que poderíamos lavar usando o tempo livre. O mais intrigante é constatar que talvez nossas discussões humanas já estejam, de certa forma, mecanizadas, baseadas em certezas imutáveis que jamais questionamos para não perder a discussão. Pensando assim, o computador que discute com base em dados tem lá suas vantagens.
FÁBIO PRIKLADNICKI