quinta-feira, 26 de julho de 2018


26 DE JULHO DE 2018
ARTIGO


Hoje uma parte da produção artística sobrevive do mercado, mas infelizmente essa condição não se estende a todo o campo da cultura. Isto torna necessário o investimento permanente na memória cultural, na preservação de acervos materiais e imateriais, em museus e centros culturais, em novos talentos, em experiências artísticas de vanguarda, em programas de ensino das artes e, especialmente, na transmissão do legado cultural aos carentes. A sociedade precisa de símbolos culturais e do encanto e inteligência da arte.

Quando e onde o mercado não consegue viabilizar a arte, a sociedade o faz, por meio do Estado, com normas que garantam impessoalidade, lisura e qualidade. É por meio de políticas culturais que se dá o fomento à cultura em uma República democrática. Debatem-se assuntos e critérios, atuam conselhos curatoriais com autoridade e legitimidade, há ampla cooperação interinstitucional, desenvolvem-se leis, programas institucionais e editais corretos, com cronogramas, boa divulgação e muito controle na realização, por meio de instituições culturais.

O abandono dessas regras nos expõe a retrocesso cultural e político, e à degradação das relações entre Estado e cultura. Faz- nos temer que o recuo nos leve ao tempo dos coronéis, em que o poder é usado em favor dos compadres e qualquer cafonice pode ser imposta à sociedade, com recursos públicos. Poupar a cultura dos abusos do Estado é também defender a República, pauta sempre urgente.

Como ponto de partida, tratava-se de um recurso não utilizado pela douta Câmara de Vereadores, que deveria retornar ao Executivo Municipal, deixando assim de ter uma contribuição cultural. O desconhecimento dessa premissa deixa sem munição os contestantes ao projeto. Talvez por fatos similares tenha nascido a expressão "coisa de cabo da esquadra".

Alguns repórteres foram ao encontro de artistas já em busca de vibrantes libelos contra esse desperdício de verbas, que poderia ter recebido melhor destinação. Aqui, me volto a Vianna Moog, o autor gaúcho: "Na vida, sempre que optamos por uma alternativa levamos o peso das alternativas abandonadas". E Nelson Rodrigues, quando lhe perguntaram o que era mais importante: um teatro ou um hospital? Nelson, emergindo de seu robusto alarme verbal respondeu: "Um teatro e um hospital".

Em defesa de meu texto A Revolução Farroupilha, em nove edições sucessivas, com primorosa arte de Danúbio Gonçalves, devo dizer que se trata da única obra sobre o tema em forma de poema, à moda do Romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meireles, como apontou o professor Sergius, ou Auto do Frade, de João Cabral de Melo Neto. E devo concluir batendo o martelo: "Se chegarmos ao Acampamento Farroupilha, nos festejos desta data máxima da identidade gaúcha, perceberemos um triunfante predomínio da emoção sobre o conhecimento histórico dos fatos e das razões que nutrem esta insurreição que nos fez Estado independente em 1836".

Numa linguagem contemporânea, didática e encantatória, a ópera-rock merece aplauso de pé, mesmo antes de levada ao palco. Um cálice de razão, de bom senso, antes do espetáculo cairia bem a esses contestadores vazios.