quinta-feira, 28 de julho de 2022


28 DE JULHO DE 2022
TULIO MILMAN

Programão

Lá se vão algumas décadas. Eu tinha uns 10 anos quando vi a Ospa pela primeira vez. Foi em mil novecentos e setenta e poucos, em um concerto aberto para escolas públicas. Eu estudava no Anne Frank, mas minha memória aponta para um auditório no Instituto de Educação. Talvez tenha sido em outro lugar. Fiquei encantado com aquele movimento de arcos e de mãos, com a improvável harmonia entre tanta gente fazendo coisas diferentes, mas que no fim eram uma coisa só. O maestro deu uma aula sobre naipes e etiqueta na hora do aplauso. "Esperem terminar, por mais que estejam gostando", aconselhou, de forma carinhosa.

Não sou um frequentador assíduo de concertos eruditos. Mas, desde então, gosto, apesar de tecnicamente ignorante. Quando morava em Barcelona, meus avós vieram me visitar. Querendo agradá-los, comprei entradas para o Palácio da Música. Na bilheteria, a senhora me perguntou onde queríamos sentar. Eu disse: "Tanto faz". Das nossas cadeiras, à direita, não enxergávamos as mãos do pianista, viradas para o outro lado. Aprendi então que não existe "tanto faz". Falando em Catalunha, lembro-me da Ospa com o tenor Josep Carreras, nas Missões, em 1997. As 20 mil pessoas que estavam lá não esquecerão.

Sábado passado, a programação da orquestra previa jazz. Era também uma homenagem aos 95 anos da Federasul. Comprei meus ingressos e nos fomos, Jaque e eu, para o Centro Administrativo do Estado, onde fica a Casa da Ospa. Fazia algum tempo que eu não acompanhava uma apresentação. A primeira surpresa foi a lotação absoluta. Não havia sequer uma cadeira vazia. Depois, o perfil do público, jovem. Meu avô, se olhasse aquilo, diria que alguns estavam "mal vestidos", tipo camiseta e chinelo. Eu explicaria que isso, hoje, não existe mais. Acho que não existe, sei lá. Tanto faz.

O importante é que a apresentação foi fantástica. Uma orquestra sinfônica energizada, sob a batuta do maestro Evandro Matté, dividindo o palco com artistas de uma vertente bem mais popular.

Estacionamento fácil, entrada fácil, lugar bonito e acolhedor. Um baita programa para um sábado, 17h. Quando a apresentação terminou, saímos, Jaque e eu, encantados. Na saída, encontramos o presidente da orquestra, o querido Luiz Roberto Ponte. Sabe alguém feliz? Era ele.

Comentei com Jaque quando chegávamos ao carro: "Como a gente é trouxa". Ela me olhou, curiosa. "Como é que a gente nunca tinha vindo antes?". Um dia ainda desvendo o mistério: às vezes, curtir a cidade onde moramos parece bem mais trabalhoso do que pegar um avião, atravessar o oceano e gastar uma fortuna.

TULIO MILMAN

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