sábado, 4 de maio de 2024


A melhor defesa

Em 2008, ao lado de Nelson Sirotsky e de outros colegas da RBS, acompanhei in loco uma das maiores tragédias da história do sul do país: o derretimento dos morros que cercam Blumenau, com dezenas de mortos. De lá para cá, traumatizada, a cidade se transformou em exemplo de como lidar com catástrofes da natureza.

O roteiro começa pela prevenção com base em uma lógica simples: quanto mais estivermos preparados para as dificuldades, melhor vamos superá-las. No Rio Grande do Sul, houve grandes avanços na previsão de cataclismos e no enfrentamento das consequências de secas e enchentes, mas quase nada evoluímos em obras de infraestrutura que evitem os danos humanos e físicos de chuvaradas e estiagens.

Nos anos 1980 e 1990, como repórter, presenciei também muitos episódios de inundações e deslizamentos. Apesar da brava atuação de bombeiros, militares das Forças Armadas e de voluntários, defesa civil era uma vaga noção de governos e prefeituras, algo assim como um corpo estranho e acanhado nos organogramas. A realidade vem impondo uma nova dimensão às defesas civis. Estamos, porém, a anos-luz de compreender que a melhor defesa é o investimento nas engenharias capazes de aplacar tragédias causadas por sucessivos dilúvios.

Uma questão central é que as métricas do passado que ditavam os níveis de resistência de pontes, estradas e encostas precisam ser atualizadas para um novo normal. Há menos de três semanas, as chuvas interromperam a BR-101 por três dias em Santa Catarina, em um prejuízo incalculável para a economia. Os transtornos e as perdas causados por quedas de pontes e destruição de dezenas de trechos de estradas no Rio Grande do Sul terão de ser melhor pesados a partir de agora no cálculo do custo de uma nova obra ou de sua revitalização.

Por uma daquelas nossas características de pioneirismo, o Rio Grande do Sul conta com um dos mais renomados centros de ciências hídricas da América Latina, o Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS. O Brasil tem quatro faculdades de engenharia hídrica e duas delas estão aqui no Estado - a outra é na Federal de Pelotas. Não adianta, contudo, se ter os melhores experts na área e na engenharia civil se não houver contrapartida na realidade para além dos muros acadêmicos.

É preciso, sobretudo, investir pesadamente na correção de cursos de água, em barreiras contra inundações, em materiais e obras mais resistentes e, quando possível, na realocação de moradias e áreas produtivas para fora do raio de desgraça das intempéries. Infelizmente, prevenção dá pouco voto e, portanto, o tema só ganha projeção em momentos críticos como o que vivemos agora. Mas há esperança: um dia também já se achou que montar e equipar as defesas civis era só perda de tempo.

MARCELO RECH 

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