
Resposta a fraude no INSS deveria ser reestruturação
A gravidade da escala da fraude nos benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) é tamanha que deveria disparar uma grande reestruturação do governo. Não só a estimativa já espantosa de desvio de R$ 6,3 bilhões avançou para perto de R$ 8 bilhões como tende a agravar outros problemas internos e externos: a queda na popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a fragilidade exposta por um convite esnobado ao ministério e a já delicada situação das finanças públicas.
Por isso, a demissão do até então presidente, Alessandro Stefanutto, e dos outros cinco funcionários que tiveram pedido de afastamento aceito pela Justiça deveria ser apenas o ponto de partida, não o de chegada.
Embora o problema não seja novo - a fraude foi exposta pelo Grupo de Investigação da RBS (GDI) há seis anos - o que confere a seriedade do problema exposto por Polícia Federal e Controladoria-Geral da União (CGU) é a escala atingida entre 2023 e 2024, dois anos em que os descontos potencialmente irregulares ultrapassaram a casa do bilhão.
Há providências urgentes a serem tomadas: primeiro, é preciso permitir que milhões de aposentados e pensionistas consigam checar se foram ou não prejudicados. Como disse na véspera o ministro-chefe da CGU, Vinícius Marques de Carvalho, em uma amostragem feita na investigação, eram irregulares 97% dos descontos feitos nos benefícios.
Facilidade para golpistas
Essa constatação levou a uma enxurrada de consultas aos extratos do INSS e à conclusão de que os meios digitais para verificação não são nada amigáveis, especialmente para esse público, mas não apenas para os mais velhos. Essa característica, aliás, facilitou a ação dos fraudadores: uma das mais usuais formas de corrupção é criar dificuldades para vender facilidades.
Outra providência urgente é reparar as perdas dos beneficiários no menor prazo possível, não "um dia", como acenado pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski. Essa tem de ser a prioridade 1 da nova estrutura do INSS. A Justiça já bloqueou e apreendeu bens adquiridos com o produto da fraude, o que pode ajudar, mas como ainda não se sabe sequer o valor exato do rombo, dificilmente será o bastante.
E a correção de um erro que não nasceu mas se agravou na atual gestão deveria dar novo norte ao governo Lula: recuperar no serviço público a noção original desse nome. É possível detectar, nos servidores mais bem-intencionados, mais foco no processo do que na entrega. Isso não quer dizer uma entrega por si mesma, como ocorre com algumas ferramentas que são oferecidas sem atenção ao seu uso na vida real. _
Povo condiciona escolha do sucessor de Francisco
O conclave para a escolha do papa que vai suceder Francisco não começa antes de 5 de maio, mas ainda vai se realizar sob o eco das multidões que se formaram para a despedida. Depois do sepultamento na igreja Santa Maria Maggiore, previsto para sábado, ainda falta o "novendiale", período de nove dias em que são realizadas missas para homenagear e orar pela alma do pontífice.
A mobilização popular reforça o legado e o exemplo do papa que considerava a Igreja Católica como lugar de "tutti, tutti, tutti". E também condiciona as escolhas do colégio cardinalício, cuja composição foi modificada de forma drástica por Francisco, sem significar que a maioria dos nomeados por ele se alinhe a suas ideias.
Os números impressionam, é verdade: foram indicados pelo mais recente papa 108 dos 135 cardeais votantes. Restam 22 indicados por Bento XVI; e cinco, por João Paulo II. A diversidade que Francisco buscou não foi a do posicionamento teológico ou ideológico, mas geográfica.
Embora exista debate legítimo sobre efeito líquido do pontificado de Francisco, há uma certeza: nunca se falou tanto sobre o líder da Igreja Católica. A discussão é se isso aumentou o número e o engajamento de fiéis em um mundo dominado por outro sistema de crenças e ídolos - dos de ouro aos de barro. _
Por que é mais fácil cortar árvores do que limpar postes?
Quase um ano depois da enchente que deixou quase todo o Centro Histórico de Porto Alegre inundado, cresceu a consciência sobre a necessidade de a Capital se aproximar do conceito de "cidade-esponja". Em tese. Na prática, ainda é mais fácil propor e executar o corte de árvores do que limpar os postes do lixo tóxico enroscado.
Cidades-esponja exigem áreas em que a água da chuva "é filtrada pela vegetação e permanece nesse solo por um determinado momento; depois, é absorvida pela rede de tubulação", como disse a porto-alegrense Taneha Kuzniecow Bacchin, professora de projeto urbano na Universidade Técnica de Delft, na Holanda.
Na Porto Alegre em que muitos veem nas árvores mais risco do que oportunidade, há dificuldades institucionais e burocráticas para a remoção de uma fiação que, além de inútil e fonte de poluição visual, ainda ameaça vidas e o fornecimento de energia sem cortes.
Podas adequadas, como já ensinou a bióloga Lilly Lutzemberger, filha do ecologista que mostrou o caminho há décadas, são "remédio", desde que não se tornem "mutilação adoecedora." Ávores não são intocáveis, portanto. Mas também não podem ser bode expiatório.
Com a mesma dedicação conferida a projetos para propor e executar podas e cortes, seria possível remover os obstáculos para a retirada dos fios. Mas isso exige determinação e persistência, não discurso populista. _
EUA X China: negociar ou não
Sob pressão de empresas, do mercado financeiro e até de parte expressiva do seu partido, Donald Trump cedeu, dando sinais de flexibilização na guerra comercial contra a China e na tentativa de derrubar o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA).
Ontem, seu necessário recuo ficou um pouco mais caro: a China avisou que não está em negociações com os Estados Unidos, como insinuava a Casa Branca. Mesmo assim, os mercados seguiam reagindo bem, mas sem euforia. Os principais índices da bolsa de Nova York subiram entre 1,23% (DJIA, o mais tradicional) e 2,03% (S&P 500, o mais abrangente). A bolsa de tecnologia Nasdaq avança 2,74%. O dólar no Brasil cai 0,47%, para R$ 5,692. Para resolver o problema que ele mesmo criou, Trump será obrigado a dar o primeiro passo. Já o fez verbalmente. Seu desafio, agora, será executar na prática a redução da tarifa que anunciou, mas não aplicou. _
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