quinta-feira, 9 de janeiro de 2014


09 de janeiro de 2014 | N° 17668
PAULO SANT’ANA | MOISÉS MENDES - INTERINO

O reserva de Pelé

Ontem, alguém tentou aplicar um golpe em você. Hoje, outros tentarão lográ-lo. Alguns são mascarados, outros vêm de rosto limpo. Alguns nem ilegais são. Há os escancarados, mas os dissimulados são maioria.

Agora, é época do golpe do camarão. Um saco de plástico transparente com cinco quilos de camarão. Camarões gigantes, pescados há pouco e por um bom preço. Você compra e descobre que o resto é todo miudinho. Os camarões graúdos estavam só em cima, numa camada rasa.

Para chegar à praia e cair no golpe do camarão, você passou pelo pedágio e pelo posto que aumentou a gasolina em mais de 10% (e o dono se queixa do Renan Calheiros). Logo depois, pegou a tranqueira de 30 quilômetros antes da ponte de Laguna. A ponte não foi erguida até hoje porque o Tribunal de Contas da União desconfiou de superfaturamento e mandou parar tudo.

A repórter Sônia Bridi contou no Fantástico que o governo negociou com as empreiteiras e conseguiu “um desconto” de R$ 40 milhões. Desconto, essa foi a expressão irônica que ela usou. E as obras foram iniciadas. O projeto da ponte havia sido sequestrado pelos empreiteiros.

E você segue viagem para a praia com as bermudas que comprou na Black Friday, a grande liquidação mundial. Só que as bermudas custavam durante todo o ano R$ 40, às vésperas da promoção passaram para R$ 70 e no dia da liquidação voltaram a valer R$ 40. A liquidação brasileira envergonha a Black Friday no mundo. É uma farsa.

Você volta do veraneio e mergulha nos preparativos da declaração do Imposto de Renda. O IR come cada vez mais o que você ganha. Não é ilegal? A OAB está questionando. É a esperteza oficializada. Você é saqueado todos os anos pela correção irrisória da tabela do imposto. Mas o governo tudo pode. E não acontece nada. Assim como não acontece nada com a correção de 3% (três por cento) ao ano do seu FGTS. Você ganha num ano o que o juro do cheque especial cobra em 10 dias.

E ainda tentam roubar você com os golpes pela internet, com o cartão de crédito clonado, com o produto e o serviço que não têm o que prometem. E vão saqueá-lo mais adiante na Páscoa, quando um ovo custará quatro vezes o preço de uma barra de chocolate com o mesmo peso.

Há muito tempo, o estelionatário gaúcho Bolão do ICM deu uma entrevista ao colega Alexandre Bach em que lamentava ter sido preso, mas anunciava: “Em menos de dois anos, eu estarei em liberdade para gastar o que ganhei”. Ganhou milhões em golpes com o imposto estadual. Foi solto e passou a aplicar o golpe do boi gordo em São Paulo. Era uma pirâmide.

A fraude do camarão, citada lá no começo, foi só para fazer o introdutório. É apenas um trambique. Os grandes golpes são os aplicados cotidianamente, com o glamour da legalidade por gente bem constituída, com bom nome na praça.

A falsa liquidação, a gasolina adulterada, a água de poço que o bicarbonato de sódio transforma em água mineral, a internet com velocidade fraudada, o leite com ureia – tudo é golpe. E quase sempre não acontece nada. Desculpem, mas a azia desse calorão aciona meu pessimismo.

Você nunca deve ter ouvido falar de Adilson, jogador daquele Santos imbatível de Pelé. Adilson era o reserva de Pelé. Quando entrava, fazia o que era possível, um drible e um golzinho de vez em quando. A torcida até gritava seu nome como incentivo. O reserva do Rei dizia que gostava de ficar no banco porque via Pelé de perto e de graça.

É o que eu faço aqui na Zero com o Sant’Ana. Agora, tive minha chance e venho dando uma de Adilson, enquanto o Pablo passa os dias só com a cabeça de fora no mar de Garopaba. Que volte logo, antes que meu repertório acabe.