segunda-feira, 21 de novembro de 2016



21 de novembro de 2016 | N° 18693 
CÍNTIA MOSCOVICH

DONO DE BOATE

Num artigo publicado no blog Estudos Lusófonos, mantido pelo professor da Sorbonne Leonardo Tonus, o escritor e jornalista Alexandre Staut comenta que, no Brasil, dono de boate tem mais valor que escritor. Diz ele que, ao folhear as grandes revistas internacionais, como a Elle e a Vogue, costuma encontrar alentadas matérias que festejam escritores em atividade – acaba de topar com 10 páginas dedicadas a Paul Auster, por exemplo. No Brasil, quase ninguém sabe quem são nossos escritores, nenhuma curiosidade despertam, como se todos estivéssemos trabalhando para público algum.

É por isso que, quando mais uma Feira do Livro acaba, todos os que somos do ramo sentimos essa tristeza comprida e persistente. Na Feira, escritores são profissionais respeitados e valem tanto quanto um dono de boate ou de qualquer outro comércio. Voltamos a crer que a literatura é essencial e que o hábito da leitura é imprescindível. E nutrimos a fantasia de que escritores são tão necessários à vida nacional quanto contadores ou advogados.

Durante a primeira quinzena de novembro, na Praça da Alfândega, autores como Valter Hugo Mãe, Ziraldo, Thalita Rebouças e Marta Medeiros, só para citar alguns, foram tratados como estrelas de TV. Eu, a patrona mais feliz da face da terra, que ficava com a minha cadeirinha de armar na Praia da Feira, fui beijada e abraçada por centenas de pessoas. A cada dois passos eu era obrigada a parar para alguma selfie. Era a própria rock star – com direito à amantíssima torre de merengues da Esther Grossi.

Esse valor, o de recuperar a importância dos que se dedicam a escrever, é uma das muitas realizações da Feira. Com isso, e por via de consequência, valoriza-se a leitura não só como fonte de conhecimento e de formação individual, mas de todo o sistema em que nos movimentamos.

Agora, segue o varejo dos dias. Fica, no entanto, o agradecimento à Câmara Rio-Grandense do Livro, que nos faz sentir, com todo o respeito, ainda mais valorosos que donos de boate ou de qualquer outro negócio.