hélio schwartsman
20/11/2016 02h00
O fim da solidão
Pelo menos no plano das ideias, acabou-se a solidão. Hoje em dia, com a internet, é muito fácil encontrar quem pense como você, mesmo que suas ideias sejam para lá de estapafúrdias. Foi isso o que permitiu, por exemplo, que um bando de malucos que defende a instalação de uma ditadura militar no Brasil invadisse a Câmara dos Deputados na última quarta-feira para ali fazer um fuzuê.
De forma ainda mais dramática, é isso o que possibilita que alguns jovens desmiolados se alistem como soldados do Estado Islâmico e se prontifiquem a morrer pelo grupo. Aqui, a ideia em questão é tão extravagante que sobrepuja o próprio instinto de sobrevivência. Não é sempre que isso acontece, mas, num mundo em que praticamente a metade dos 7 bilhões de terráqueos usa a internet, é quase uma fatalidade estatística encontrar quem partilhe as mesmas doidices.
E não é só. Entre as muitas patologias do pensamento de grupo que a psicologia social já mapeou, destaca-se o fenômeno da polarização. Se você juntar um punhado de indivíduos com opiniões semelhantes e deixá-los conversando por um tempo, o grupo sairá com convicções mais parecidas e mais radicais.
É claro que, antes da rede de computadores, pessoas também tinham ideias estúpidas. Mas, como não tinham tanta chance de encontrar suas almas gêmeas, pensamentos exóticos que porventura pudessem eclodir tendiam a ser suprimidos pelos consensos sociais prevalentes. A chamada tirania da maioria pode ser extremamente autoritária e liberticida, mas também serve para reprimir algumas más ideias antes de elas se popularizarem.
Agora, vivemos uma era em que já não existe solidão intelectual. E, se isso é ótimo para produzir inovações, traz como contrapartida o ônus de dar asas à imaginação de doidos às vezes perigosos. Acho que isso é parte de nosso admirável mundo novo.