sábado, 1 de dezembro de 2018


01 DE DEZEMBRO DE 2018
INDICADORES

Rico mais rico, pobre mais pobre

Já escrevi várias vezes, neste espaço, sobre desigualdade. E o estudo da Oxfam divulgado esta semana me assegura que é bom falar mais. O documento chama atenção para o fato de o Brasil ser o 9º país mais desigual do mundo, sendo que, entre 2016 e 2017, não houve qualquer melhoria na distribuição de renda. E um dado particularmente impressionante é que, neste período, a metade mais pobre da população brasileira viu seu rendimento do trabalho cair 3,5% em média; já os 10% mais ricos tiveram um aumento de 6% em seu rendimento médio. Sim, o pobre ficou mais pobre e o rico ficou mais rico em meio à crise!

Para ilustrar um pouco melhor esses números, fiz um exercício com os dados da PNAD Contínua, do IBGE, do primeiro trimestre deste ano. Selecionei apenas as pessoas ocupadas com mais de 18 anos e calculei a renda domiciliar per capita (a soma da renda do trabalho de todas as pessoas no domicílio, dividida pelo número total de moradores, incluindo crianças). A média desta renda foi de R$ 838,25. Isso significa que, na média, uma família de quatro pessoas vive com R$ 3.353,00. Acontece que a média engana mais do que você supõe.

Metade dos trabalhadores brasileiros tem renda domiciliar per capita de no máximo R$ 466,66 - uma família de quatro pessoas vive com R$ 1.866,64, neste caso. Note que este número é praticamente a metade da média. E quando a renda per capita mensal do domicílio atinge R$ 1.875,00, ele estará entre os 10% mais bem pagos no Brasil. A diferença entre os 50% mais mal pagos e os 10% mais bem pagos é mais de quatro vezes.

A questão aqui não é a diferença, por si só. O elemento central é que a desigualdade é brutal e nenhum tipo de abordagem de meritocracia é capaz de justificar tamanho desequilíbrio na distribuição de renda do Brasil. Nem mesmo o argumento raso de que "o problema é a pobreza e não a desigualdade". Não há como reduzir significativamente a pobreza sem melhorar a distribuição de renda!

A retomada da economia é capaz de trazer algum alento, sim. Mas, não é suficiente para melhorar de fato a condição de vida dos mais pobres se não se observar a distribuição de renda. Olhar para as décadas de 1970 e 1980 com saudosismo do crescimento econômico, sem reconhecer que neste período a desigualdade e a pobreza se aprofundaram no Brasil, é pensar no país pela metade. Na realidade, pensar em bem menos da metade.

ELY JOSÉ DE MATTOS

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