ELIO
GASPARI
O coronel Avólio e seu serviço ao
Exército
Militar
contou à Comissão da Verdade o que viu no dia em que mataram o deputado Rubens
Paiva
Armando
Avólio Filho era um jovem tenente no dia 20 de janeiro de 1971, quando Rubens
Paiva chegou preso ao DOI do Rio de Janeiro. Durante 43 anos seu nome foi
tangencialmente associado a esse crime. Em 1996, pediu um conselho de justificação
para livrar-se da suspeita. Seu pedido foi negado pelo ministro Zenildo de
Lucena. Em diversas ocasiões mostrou seu interesse em esclarecer os fatos, mas
os chefes da ocasião sempre ordenaram-lhe que ficasse calado, para proteger a
instituição. Felizmente, protegendo a instituição, Avólio decidiu contar à
Comissão Nacional da Verdade o que viu. Só o que viu.
Desse
depoimento, revelado pelo repórter Chico Otávio, resulta que ele viu um tenente
(Fernando Hughes de Carvalho) numa sala, com um homem destruído. Mais tarde
associou-o a Rubens Paiva. Até aí o caldo é ralo, pois no DOI se apanhava e lá
morreu de pancada o ex-deputado. No máximo, a responsabilidade deslizaria para
um tenentinho que, além do mais, está morto.
A
principal revelação de Avólio, hoje um coronel reformado, está no fato de que,
naquele dia, contou o estado do preso ao major José Antonio Nogueira Belham,
comandante do DOI. Belham sabe o que acontecia no destacamento, mas nunca se
meteu com os bicheiros e contrabandistas que bicavam no DOI do Rio. Seguiu sua
carreira e chegou a general de divisão. No governo de Lula, já na reserva,
ocupava a vice-presidência da Fundação Habitacional do Exército. Encrencou-se
com as viúvas dos militares mortos no terremoto do Haiti e foi demitido.
Belham
informa que no dia 20 de janeiro de 1971 estava de férias. (Nesse caso, a
responsabilidade deslizaria para o vice-comandante, que está morto.) Estava de
férias, mas estava lá. Esse fato, mencionado por Avólio, foi formalmente
corroborado por um coronel (capitão à época), que morreu em janeiro.
Quem
tirou o cadáver de Rubens Paiva de lá? Quem coordenou o teatrinho? (Num caso
anterior, fracassado, foi o Centro de Informações do Exército, subordinado
diretamente ao gabinete do ministro Orlando Geisel e comandado por seu chefe de
gabinete.) Depois da revelação da presença de Belham na cena do DOI, a comissão
viu a ponta de dois fios que levam a meada para cima. Afinal, tanto trabalho
para responsabilizar um tenente morto seria um novo teatrinho, institucional.
Nele, cultiva-se uma narrativa segundo a qual a tortura e os assassinatos eram
coisa de agentes desautorizados (de preferência, mortos). Patranha.
Eram
uma política de Estado, dos presidentes, ministros e generais comandantes das
grandes unidades. Para ilustrar: o tenente Hughes ganhou a Medalha do
Pacificador no ano da morte de Rubens Paiva. Cada torturador foi um torturador,
mas o conjunto dos torturadores foi um plantel formado, disciplinado e premiado
por seus superiores, transformando jovens oficiais em assassinos.
Chegaram
ao conhecimento de membros da comissão dois fatos. No primeiro, quando começou
a operação de retirada do cadáver, durante a madrugada, as luzes foram
apagadas. No segundo, contado por um militar, dois oficiais do CIE barraram-no
na porta do DOI. Um deles está vivo.
Atitudes
como a de Avólio nesse caso servem às Forças Armadas, tirando-lhe das costas a
cruz das mentiras desmoralizantes que carregam desde o século passado. Ele
tirou de sua biografia uma acusação que carregou em silêncio ao longo de
décadas. Negaram-lhe a oportunidade funcional, mas o coronel falou na
jurisdição competente. Pode parecer que seja pedir muito, mas se os atuais
comandantes militares fizessem um elogio público a todos os oficiais que estão
colaborando com as investigações, todo mundo ganharia. Podem até fazer um
elogio genérico, abrangendo aqueles que mentem, não faz mal. Basta sinalizar
que condutas como a de Avólio servem ao Exército.
SELFIE
Aconteceu
em Belo Horizonte há quinze dias.
A
senhora caminhava nas proximidades da Assembleia Legislativa e aproximou-se um
homem magro, de camiseta, com uma faca:
--Vai
passando a bolsa. Estou com fome.
--Passo,
mas primeiro deixe eu tirar os documentos.
--Pode
tirar, esse negócio de burocracia é uma bosta... Pera aí... A senhora não é a
ministra?
--Sou.
--Foi
mal. Pode ficar. Gosto muito da senhora, desde o tempo do governador Itamar.
--Você
quer dinheiro para comer?
--Não,
vá em paz. Agora, o que eu queria era tirar uma fotografia com a senhora.
--Isso
não. Meu cabelo está muito desarrumado.
O
cidadão guardou o celular e a ministra Cármen Lúcia seguiu em frente.
ALZHEIMER
O
Ministério Público Federal colheu dezenas de depoimentos de civis e militares
que estavam na incubadora e na cena do atentado do Riocentro, em 1981.
Quase
todos os militares lembraram de pouca coisa. Um dos que mostraram ter melhor
memória foi o coronel Edson Lovato, que começou seu depoimento esclarecendo que
sofre do mal de Alzheimer e toma 13 comprimidos por dia.
VENDO
O FUTURO
Pelo
andar da carruagem, alguns deputados que formaram o "blocão" e querem
azucrinar o governo instalando mais uma CPI da Petrobras daqui a dez anos
estarão se defendendo no Supremo Tribunal Federal. Sustentarão que é
improcedente a acusação segundo a qual formaram uma quadrilha. Pelo visto,
terão bons argumentos, vindos de sábios da jurisprudência.
UM
GOLPE DO ATRASO NOS PONTOS DE ÔNIBUS
Está
em curso um novo golpe de marquetagem de prefeitos e cartéis de companhias de
transportes públicos. É a colocação de painéis eletrônicos em pontos de ônibus,
informando as previsões de horários de passagem dos coletivos por ali. Trata-se
de uma bugiganga redundante, visto que hoje no Brasil há 271 milhões de
telefones celulares e, com eles, pode-se obter essa informação, antes mesmo de
se chegar ao ponto.
Houve
época, quando não existiam os necessários aplicativos, em que esses painéis
eram úteis (quando funcionavam). Se alguém quiser colocá-los nos pontos, pode
fazê-lo, desde que os prefeitos não joguem dinheiro da Viúva nisso, nem os
cartéis dos ônibus apresentem seus custos (e sua manutenção) nas planilhas com
que vão buscar aumentos de tarifas. O que o passageiro quer deles é
regularidade no serviço e conforto na viagem, e isso não dão.
Quando
esses painéis são apresentados como um exemplo de políticas públicas modernas
de prefeitos ou dos serviços dos cartéis, estão apenas confirmando o velho
versinho do poeta Cacaso:
Ficou
moderno o Brasil,
ficou
moderno o milagre
Água
já não vira vinho,
vira
direto vinagre.