03 DE FEVEREIRO DE 2018
MARTHA MEDEIROS
Aos navegantes
Se eu pudesse definir o perfil do futuro presidente (homem ou mulher), gostaria que fosse uma pessoa obstinada em encontrar soluções simples e inovadoras para velhos problemas, que fosse metódico e comprometido com a eficiência de tudo, que tivesse liderança suficiente para engajar os outros em seus projetos e que se antecipasse às crises, investindo em planejamento. Em suma, que fosse prático e criativo, mas não um aventureiro.
Aí me dou conta que esse cara existe e se chama Amyr Klink, que tantos consideram justamente um aventureiro.
Não Há Tempo a Perder, seu livro lançado em 2016, é um longo depoimento dado à editora Isa Pessoa, em que ele comenta não apenas sobre suas viagens solitárias pela Antártica e sobre sua travessia da África para o Brasil num barco a remo, mas também revela sua maneira de ver o mundo, suas convicções, seu estilo de comportamento, o dinamismo com que reverte imprevistos. Focado, discorre sobre as razões pelas quais, mesmo se dedicando a uma atividade considerada perigosa como a navegação de longa distância, nunca passou por nenhuma situação muito grave e sempre voltou para casa são e salvo.
A razão é óbvia: ele não é nem um pouco aventureiro.
Ao contrário do que parece, Klink não gosta de experiências dramáticas e de colocar a vida em risco (nem a dele, nem a de ninguém) e, por isso, investe muito em conhecimento e se empenha à exaustão até realizar seus planos. Ainda assim, admite que em tudo há uma porcentagem de erro. Faz o possível para minimizá-la, mas não a ponto de ficar paralisado pela busca da perfeição - tem uma hora em que é preciso partir, já que nada é perfeito e nunca será. Então, ele vai. E volta pra contar.
Não é homem de deixar nada incompleto, pelo meio do caminho - valoriza as conclusões. Eficiência é isso: começar e terminar. Aí, lembro que o Brasil é esse imenso canteiro de obras inacabadas, de estradas esburacadas, de variados exemplos da nossa incompetência para ir até o fim, para entregar o prometido, para cumprir o combinado. Um país feito apenas de pontapés iniciais.
É fácil supor que ser presidente da República é uma viagem na qual Amyr Klink nunca sonhou em embarcar. Então, só resta recomendar a leitura de seu livro a quem pleiteia o cargo este ano, e que se dê atenção para a parte em que Klink fala da importância de não apenas cuidarmos do que é nosso, mas especialmente cuidarmos do que não é nosso - que esse pensamento seja constante e inspirador para aqueles que se apresentam como opção para governar um país que não é de alguns, e sim de todos.
Aliás, vale pro nosso cercadinho também: cuidar do que é do vizinho, cuidar do que é do colega de aula, cuidar do que é do parceiro de trabalho, cuidar do que é do bairro, da cidade, da coletividade. Um pouco mais de zelo e quem sabe a gente não continue assim, tão à deriva.
MARTHA MEDEIROS