15 DE FEVEREIRO DE 2018
L.F. VERISSIMO
Amores
Se você anda se martirizando por não ter podido ver os filmes que concorrem ao Oscar, sossegue. Vi três dos oscaráveis de 2017 e posso resumi-los para que você participe de conversas sobre o assunto e minta com inteligência. Os três filmes que vi são sobre as diferentes manifestações de amor. O primeiro, A Forma da Água, é uma variação do velho tema do caipira na cidade grande. Um brasileiro, da Amazônia, é levado para os Estados Unidos, onde desperta o interesse de uma faxineira e - por razões que nunca ficam bem claras - dos russos.
O que os russos querem com o amazonense permanece um mistério (teria algo a ver com uma resposta americana ao cachorro que os soviéticos colocaram em órbita da Terra treinado para dar gargalhadas sarcásticas cada vez que passava por cima dos Estados Unidos), mas o que a faxineira quer fica evidente quando ela, que é muda, usa linguagem de sinais, como puxá-lo para dentro da sua banheira junto com ela. Não vou contar como o filme termina. Só dizer que as chances de o brasileiro conseguir um Green Card para poder trabalhar nos Estados Unidos são remotas, ainda mais com aquelas escamas e o presumível mau cheiro. Tudo parece se encaminhar para um final feliz à beira do Amazonas.
The Post também é uma história de amor, no caso o amor de jornalistas pelo jornalismo. Eu me comovi, não com o relato dos segredos do Pentágono revelados por jornais corajosos ou com a decisão da Suprema Corte Americana - apesar de ser uma corte conservadora, na época - a favor dos jornais que o governo queria calar.
Me comovi com os linotipos. A mudança da impressão quente para a impressão fria foi tão radical, que fica difícil acreditar que se deu em tão pouco tempo. A era do chumbo acabou de um dia para o outro. E quem teve alguma vivência em gráfica de jornal não perde a lembrança daquelas velhas máquinas com algo de dinossauros, que literalmente soltavam fumaça. O amor pelo nosso passado também é um modo de nos autoelogiarmos. Nunca trabalhamos no Washington Post ou no New York Times, o que não impede que nos achemos formidáveis.
E depois do amor pelo diferente no A Forma da Água e do amor pela cálida lembrança de uma máquina, o que não deixa de ser uma forma de tara, é bom poder falar de um filme que trata do amor convencional, normal, sem complicações: Me Chame pelo seu Nome. Rapaz conhece rapaz, rapaz e rapaz se apaixonam, rapaz e rapaz se separam, sobe música romântica e fim. Ainda fazem filmes de amor como antigamente.
L.F. VERISSIMO