ELIANE
CANTANHÊDE
Fraude institucional
BRASÍLIA
- A abertura do ano legislativo, no início de fevereiro, vai ser num ambiente
de enorme constrangimento. Não bastasse a vitória iminente de Renan Calheiros
para a presidência do Senado e de Henrique Eduardo Alves para a da Câmara, há uma
pauta monumental em atraso, nem o Orçamento de 2013 foi aprovado ainda e as
relações com o Judiciário vão de mal a pior.
Não
combina com democracias um Poder fazer ouvidos de mercador em relação a outro. Mas
é o que o Congresso faz duplamente com o Supremo Tribunal Federal: ao abrigar
quatro deputados condenados pelo mensalão e ao não votar um modelo de distribuição
para o FPE (Fundo de Participação dos Estados) no tempo determinado pela corte.
O
FPE é um "case" de como ninguém leva a lei a sério, a começar dos próprios
legisladores. Se a lei não encaixa nos interesses de Poderes e de poderosos,
dane-se a lei.
Ao
ser criado em 1989, o fundo destinou 85% de repasses para o Norte, o Nordeste e
o Centro-Oeste, prevendo a revisão do critério três anos depois. A revisão
nunca foi feita, o modelo original foi ficando e está aí até hoje -apesar de
ilegal.
Descoberta
essa, digamos, fraude institucional, o Supremo oficiou o Congresso em fevereiro
de 2010 para corrigir o vácuo de 20 anos e definir o novo modelo até dezembro
de 2012. Mais uma vez, nada foi feito e o FPE continua ilegal. O que fazer?
Como
o fundo representa até 60% da receita de alguns Estados menores, deu-se o
famoso jeitinho brasileiro. O TCU sacou uma saída e o governo a agarrou
correndo: mantenha-se o formato em uso, por enquanto...
Agora,
vários Estados reclamam uma solução, e o presidente interino do Supremo,
Ricardo Lewandowski, cobra novamente o Congresso, mas o presidente do Senado,
José Sarney, reage contra a intervenção entre Poderes. O tema é "muito
complexo", alega. E, assim, a fraude se perpetua no país do faz de conta.
elianec@uol.com.br