27
de julho de 2014 | N° 17872
FABRÍCIO CARPINEJAR
Bem que você poderia me
amar
Você
pode amar para esquecer quem foi um dia.
Você
pode amar para lembrar quem foi um dia.
Você
pode amar para recuperar a infância.
Você
pode amar para repetir a adolescência.
Você
pode amar para combater a velhice.
Você
pode amar de olhos abertos, enxergando as falhas.
Você
pode amar de olhos fechados, relevando os foras.
Você
pode amar para se endividar.
Você
pode amar para criar patrimônio.
Você
pode amar para encontrar equilíbrio.
Você
pode amar para se aproximar do abismo.
Você
pode amar para ganhar lucidez.
Você
pode amar para enlouquecer.
Você
pode amar para adoecer de ciúme.
Você
pode amar para ter segurança.
Você
pode amar pessimista, falando mal aos seus amigos.
Você
pode amar com esperança, silenciando os atritos.
Você
pode amar magoado.
Você
pode amar leve e desembaraçado.
Você
pode amar para romper o padrão de antigos amores e aceitar que estava errado.
Você
pode amar para imitar outros amores e se convencer de que estava certo.
Você
pode amar fraquejando e acreditando nas próprias mentiras.
Você
pode amar dizendo unicamente a verdade e suportando as crises da franqueza.
Você
pode amar para confirmar expectativas.
Você
pode amar para contrariar sua idealização.
Você
pode amar para converter bandidos em santos.
Você
pode amar para fazer santos pecarem.
Você
pode amar à primeira vista.
Você
pode amar por repescagem.
Você
pode amar desconfiando e questionando as evidências.
Você
pode amar por clarividência.
Você
pode amar para ser triste e se deprimir de canções e livros.
Você
pode amar para alegrar as estantes e os ouvidos.
Você
pode amar para concordar com o terapeuta.
Você
pode amar para se opor ao terapeuta.
Você
pode amar para fugir da família.
Você
pode amar para unir a família.
Você
pode amar superficialmente, escondendo o que pensa.
Você
pode amar profundamente, sem segredos e âncora para se fixar nas palavras.
Você
pode amar pelo sexo.
Você
pode amar pelo romance.
Você
pode amar pela exposição.
Você
pode amar pela solidão a dois.
Você
pode amar os intermináveis problemas e brigas.
Você
pode amar a paz que vem com o fim da noite.
Você
pode amar compreendendo e rindo dos defeitos.
Você
pode amar julgando e condenando as diferenças.
Você
pode amar cuidando das roupas, da comida, da casa.
Você
pode amar com a arruaça das ruas e da boemia.
Mas
amor mesmo é quando você está contando seus dias, com toda a concentração dos
números, e alguém chega para lhe atrapalhar de eternidade. E você esquece onde
estava, a soma da sua vida, e só pensa em ficar para sempre do jeito que for.
Ainda que seja por um dia.