Com 80 anos e energia para os 100
O
segredo dos octogenários que são independentes, produtivos – e felizes
CRISTIANE
SEGATTO - 25/07/2014 21h39 - Atualizado em 25/07/2014 22h36
Para
descobrir a idade de alguém, observe as mãos. Essa estratégia, quase sempre
infalível, não funciona com Adib Jatene, de 85 anos, o mais célebre dos cirurgiões
cardíacos brasileiros. Com poucas rugas e unhas muito bem aparadas, as mãos
dele parecem 20 anos mais jovens. Comandadas por um cérebro admirável, elas
executaram 40 mil operações. Há poucos meses, Jatene abandonou as salas de
cirurgia. Tem consciência das limitações físicas impostas pelo tempo. Isso não
significa a aposentadoria.
Sua
agenda continua lotada. Todos os dias, atende pacientes no Hospital do Coração (HCor),
em São Paulo. Circula pelos corredores numa cadeira motorizada ou apoiado numa
bengala. Há três meses, foi submetido a uma cirurgia de coluna. Um
estreitamento na medula provocava-lhe dores terríveis. Está em recuperação. “Se
fosse dar valor a isso, ficaria inutilizado”, diz. “Nunca me queixo.”
Sempre
que pode, ele dá uma escapada até a oficina do Instituto Dante Pazzanese,
hospital cardiológico que mantém um laboratório de equipamentos médicos. Jatene
tem lugar cativo e seu nome está inscrito na bancada. É lá que se revela uma de
suas vocações mais genuínas e pouco conhecidas: Jatene tem cabeça de engenheiro
e espírito de Professor Pardal. Trabalha, com entusiasmo, na criação de uma
versão barata da caríssima bomba implantável capaz de substituir,
temporariamente, o coração de pacientes inscritos na fila de transplante.
Jatene
é um caso que a ciência quer explicar. O que garante o alto desempenho
intelectual e a produtividade na velhice? Por que alguns octogenários mantêm o
domínio das capacidades mentais, a criatividade e o interesse pelo trabalho,
enquanto tantos estão em casa ou sofrem de depressão ou de alguma forma de demência?
Por que gente ativa como ele ultrapassa a expectativa de vida do brasileiro (71
para os homens; 78 para as mulheres) e continua com motivação e capacidade
mental para completar um século?
O
Projeto 80+, uma parceria do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade
de São Paulo (USP) com outras unidades da USP, investiga se há algo de especial
nos genes e no cérebro dos octogenários saudáveis. Cento e trinta idosos doaram
sangue e foram submetidos a exames de ressonância magnética e a outras avaliações
físicas e de desempenho cognitivo. Jatene é um dos voluntários, assim como o
economista Delfim Netto, a atriz Beatriz Segall, a bailarina Ruth Rachou, a
professora Cleonice Berardinelli e o escritor Zuenir Ventura, entre outras
personalidades.