22 de julho de 2015 | N° 18234
DAVID COIMBRA
O passarinho desconhecido
Queria saber mais dos bichos, e não sei. De todas as minhas vastas ignorâncias, essa me aborrece em especial. Agora mesmo, veio um passarinho e pousou na mureta da sacada. Passarinhos são importantes para cronistas que, vez em quando, pretendam ser líricos. O que seria do Rubem Braga sem os passarinhos? Então, olho para esse belo espécime que pia, trina e gorjeia a um braço de distância, decerto um tipo que só bate asas pela América do Norte, exótico aos leitores brasileiros, perfeito para um parnasianismo de meio de semana, e penso: vou dar uma poetada. Mas que raio de passarinho é esse? Não faço ideia. Que tristeza.
Sei alguma coisa dos grandes gatos. O rugir do leão pode ser ouvido a 20 quilômetros de distância, na noite da savana. Ele, às vezes, devora os filhotes para que a leoa entre novamente no cio. Quando isso acontece, o jovem macho pode se repoltrear no sexo 50, 60, cem vezes num único dia. Um campeão.
Mas tenho mais admiração pelos tigres. O tigre é como o detetive Philip Marlowe: um predador solitário. Ele gosta de atacar a presa pelas costas, quando ela está desprevenida. É quase impossível fugir do tigre: ele é capaz de escalar as árvores mais altas e nadar até no mar com velocidade cinco vezes maior do que a de Michael Phelps em dia de medalha olímpica. Só não é tão rápido quanto outro grande gato, o jaguar, que seria multado na maioria de nossas estradas, já que atinge 110 km/h.
Os africanos, obviamente, sabem muito sobre os bichos. Vi cenas de indígenas africanos roubando a carne da caça de um bando de leões. Foi impressionante. Tratava-se de uma zebra ou um gnu. Os leões o devoravam, cinco ou seis rosnando sobre o corpo inerte, quando os africanos chegaram com seus arcos e flechas. Os leões levantaram as cabeças e se afastaram, prudentemente. Os homens puxaram de facões, retalharam o pedaço de carne que queriam, jogaram-no nas costas e foram embora. Os leões voltaram para comer os restos.
Num outro filme, vi um africano enrolar a perna direita num pedaço de pano. Em seguida, ele enfiou a perna num grande buraco no chão. Ficou lá por alguns segundos. Aí, agitou-se, sentindo um repelão. Os amigos o puxaram, e a perna veio da terra abocanhada por uma cobra negra e gigantesca, de uns seis metros de comprimento. Os homens empunharam facas e a retalharam com paciência e método. O africano serviu de isca!
E agora, dias atrás, explodiram em toda parte dois filmes sobre tubarões. Num, os cientistas conseguiram colocar uma câmera dentro da cratera de um vulcão e viram que ela estava cheia de tubarões nadando. Quer dizer: cair dentro de uma cratera de vulcão já é ruim, imagine dentro de uma com tubarões.
Noutro filme, um surfista foi atacado não por um, mas por dois tubarões, e safou-se ileso dando chutes nos focinhos deles. Aí está: esse surfista sabe tanto sobre os bichos do mar quanto os africanos sobre os bichos da terra. Conhecimento útil para todos eles, que depararam com feras assassinas e saíram inteiros. Já eu, que quero apenas traçar algumas frases acerca de um inofensivo passarinho, nada sei, além do pouco que aprendi sobre canarinhos e pintassilgos de gaiola, pardais de calçada e vulgares pombas de praça. Como escrever a respeito do desconhecido? A ignorância, de fato, dói.