16 de julho de 2015 | N° 18228
Epa
No filme 2001 – Uma Odisseia no Espaço, do Stanley Kubrick,
astronautas descobrem na Lua (ou era em Marte?) um misterioso monólito, de
origem desconhecida. Depois fica-se sabendo que o monólito fora posto ali como
uma espécie de alarme.
Quando exploradores da Terra o descobrissem, seria o sinal
de que nossa civilização tinha os meios para invadir o espaço e se tornava uma
ameaça para as civilizações extraterrenas que nos estudavam de longe desde que
o primeiro primata acertara a primeira cacetada na cabeça de outro, e sabiam do
que nós éramos capazes. A descoberta do monólito era um aviso: atenção, a barbárie
vem aí, disfarçada de conquista científica.
Às vezes, imagino como seria ser um judeu na Alemanha dos
anos 20 e 30 do século passado, pressentindo que alguma coisa que ameaçava sua
paz e sua vida estava se formando mas sem saber exatamente o quê. Esse judeu
hipotético teria experimentado preconceito e discriminação na sua vida, mas não
mais do que era comum na história dos judeus.
Podia sentir-se como um cidadão alemão, seguro dos seus
direitos, e nem imaginar que em breve perderia seus direitos e eventualmente
sua vida só por ser judeu. Em que ponto, para ele, o inimaginável se tornaria
imaginável? E a pregação nacionalista e as primeiras manifestações fascistas
deixariam de ser um distúrbio passageiro na paisagem política do que era,
afinal, uma sociedade em crise mas com uma forte tradição liberal, e se
tornaria uma ameaça real? O ponto de reconhecimento da ameaça não era evidente
como o monólito do Kubrick. Muitos não o reconheceram e morreram pela sua
desatenção à barbárie que chegava.
A preocupação em reconhecer o ponto pode levar a paralelos
exagerados, até beirando o ridículo. Mas não algo difuso e ominoso se
aproximando nos céus do Brasil, à espera de que alguém se dê conta e diga “Epa”
para detê-lo? Precisamos urgentemente de um “Epa” para acabar com esse clima.
Pessoas trocando insultos nas redes sociais, autoridades e
ex-autoridades sendo ofendidas em lugares públicos, uma pregação francamente golpista
envolvendo gente de quem você nunca esperaria, uma discussão aberta dentro do
sistema jurídico do país sobre limites constitucionais do poder dos juízes... Epa,
pessoal.
Se está faltando um monólito para nos avisar quando chegamos
ao ponto de reconhecimento irreversível, proponho um: o momento da posse do
Eduardo Cunha na presidência da nação, depois do afastamento da Dilma e do
Temer.