10 de julho de 2015 | N° 18222
DAVID COIMBRA
DAVID COIMBRA
Tudo acabou
Quando você acha que tudo acabou, é porque você está
acabando. Por isso, fico apreensivo ao pensar que a música brasileira, por
exemplo, acabou. Entenda: não estou preocupado com a música, estou preocupado
comigo. Porque tenho, de fato, a incômoda impressão de que a música brasileira acabou.
Setenta por cento dos brasileiros gostam do estilo
sertanejo. Não são palpite, esses 70%: foi uma pesquisa que saiu outro dia.
Bem. Gosto de duas músicas sertanejas: Nuvem de lágrimas, que canto todinha,
inclusive com os solfejos, e aquela das luzes da cidade acesa, embora a cidade
estar acesa, e não as luzes, me irrite um pouco. Todas as outras milhares,
quiçá milhões de músicas sertanejas, me deixam levemente mareado.
O segundo tipo de música mais amado por esse povo inzoneiro
é o pagode. E eu? Do Zeca Pagodinho, gosto. Quando preparo uma caipirinha, por
alguma razão, dá-me ganas de cantar: “Se eu quiser fumar eu fumo, se eu quiser
beber eu bebo, pago tudo que consumo com o suor do meu emprego”. Mas Zeca
Pagodinho não é pagodinho: é sambão. O samba, deixaram o samba morrer, deixaram
o samba acabar.
O futebol brasileiro também acabou. Foi assassinado a mando
dos piratas europeus pela Lei Pelé e pelo campeonato de pontos corridos, no
começo do século. Não por acaso, a última Seleção Brasileira digna de ser
chamada de Seleção Brasileira foi a de 2002. Jogadores como Pato e Anderson,
símbolos dessa falência, são arrancados do Brasil aos 17 anos de idade, ou
antes disso, quando ainda estão em formação.
Na Europa, seu jeito de jogar é
mutilado. Eles perdem a brasilidade. Não são mais jogadores brasileiros, nem se
tornam jogadores europeus. Donde, a falta de talentos no Brasil. Por que nosso
único craque é Neymar? Agradeçam ao Santos, que o segurou até que amadurecesse.
Hoje, o maior atacante do Brasileirão é um peruano, que na quarta-feira
desmontou sozinho o Inter, no Beira-Rio. Um peruano, imagine.
Finalmente, da política brasileira só restaram trevas. No
caso horripilante do governo federal, até a corrupção seria aceitável, desde
que não houvesse ridicularias como a presidente comparar delação premiada,
voluntária e constitucional com delação feita sob tortura, ou o destrambelhado
discurso de saudação à mandioca. Quem escreve os discursos da Dilma? Por favor!
Um presidente da República, quando vira objeto de mofa, torna também o país
objeto de mofa.
É tão trágica a política brasileira, que, dia desses, me
peguei decidindo: “Nunca mais voto no PT, nem no PSDB, no PP também não dá,
nesses exageros à esquerda, como PSOL e PSTU, é impossível, o PC do B é coisa
da Coreia do Norte, o PTB é uma piada, o...”.
Então, parei. Percebi que, realmente, a política brasileira
acabou.
Fico aqui, cevando minhas nostalgias. Ah, aqueles
tempos de Zico e Ulysses, de Caetano e Romário, de Brizola e Tom, de Simonsen e
Garrincha na direita e Prestes e Rivellino na esquerda, ah, aqueles tempos em
que o Brasil ria de si mesmo, para onde foram? Para onde foram todos? Eu mesmo,
o que será de mim? Será que acabei e não sei? Será?