sexta-feira, 31 de julho de 2015


Jaime Cimenti

Domingo de noite, segunda, perguntas, respostas, poesia


Por vezes num domingo chuvoso, frio, ventoso, bem desses de inverno gaúcho, à noite, você se sente meio triste, pensando no que fez ou deixou de fazer na semana, pensando se ama ou é amado e sai caminhando sozinho pelas calçadas vazias. Fica até pensando, por um momento, com humildade extrema, que gostaria de ser apenas o reflexo da lua que brilha na água da sarjeta e se pergunta quem realmente é, de onde veio, para onde vai e outras perguntas sem resposta.

Você sabe que aquele momento vai passar, que a hora mais escura é justamente a hora anterior ao nascimento do sol, que vai brilhar na segunda-feira, ou na terça, ou na quarta... Você tenta se acalmar e caminha mais. Vai se abrigar, quem sabe, no shopping-center vazio, na companhia dos seguranças.

Você gostaria que já fosse sexta-feira, graças a Deus. Pensa que cientistas já responderam milhões de perguntas e descobriram muitas coisas, mas ainda não revelaram quem somos, de onde viemos, para onde vamos e não criaram uma pílula da felicidade para os entardeceres de domingo.

Você sabe que filósofos, há milênios, queimam pestanas indagando profundamente sobre tudo e todos, sempre perguntando e questionando mais que respondendo, mesmo assim buscando explicações e teorias sobre os seres, os planetas e os caminhos.

Sim, domingos à noite são momentos ótimos para espiritualizações e religiões, momentos para pensar na vida e na morte, no agora e no eterno, na vaidade e na modéstia, na fé e na dúvida.

Está bem, você prefere não encucar, apenas comer um sanduíche natural, tomar um suco e um sorvete, ou traçar um churrasquinho com cerveja, assistir uma comédia leve, conversar com algum amigo, namorar, quem sabe, terminar de matar o domingo numa boa e dormir até segunda. Tudo bem, você decide. Alguns restaurantes abrem domingo à noite em Porto Alegre.

Pensando bem, melhor mesmo é pensar que quinta-feira, 30 de julho, foi o aniversário de 109 anos do Mario Quintana, nosso mais querido e maior poeta. Ciência, filosofia, história, tudo bem, mas mesmo nesse mundo high tech tem mais é que reinar a poesia.

Os poetas sempre sentiram e pensaram adiante, quase sempre foram as antenas da raça, sempre vislumbraram os mistérios e as belezas invisíveis. Sempre souberam que o coração da beleza não é coisa para nossos pobres cinco sentidos. Poetas sempre abriram as portas do infinito.

A pátina do tempo cai lentamente sobre Mario Quintana, que vai poetando cada vez melhor, assim como Carlos Gardel canta cada vez melhor. Bem escreveu Quintana, que um bom poema é aquele que nos dá a impressão de que está lendo a gente ... e não a gente a ele! A simplicidade profunda, a técnica apurada e a linguagem clara de Quintana, somadas ao lirismo e aos temas eternos, mostram que, não por acaso, caiu no gosto de gerações e gerações, passando com brilho no julgamento do tempo e dos leitores. Estes são os que realmente interessam.

A propósito...

Para permanecer absolutamente o grande imortal dos leitores, dos amantes da poesia e de outros poetas, muitos inéditos, Mario Quintana não necessitou de aprovações e títulos universitários, chancelas oficiais, honrarias públicas ou privadas ou galardões acadêmicos. Não precisou rezar em "igrejinhas literárias", bater continência em movimentos artísticos ou se tornar leitura obrigatória de estudantes. 

Para viver nos corações e nas mentes de gerações, foi (é) poeta maior e pronto. Ao resto, aos demais, escreveu, sucinto, Mario: Todos estes que aí estão / Atravancando o meu caminho/ Eles passarão/ Eu passarinho. Feliz niver, Quintana! Campai, longa vida!
Jaime Cimenti